quinta-feira, 10 de abril de 2008

...também são as criaturas

Por mais absurdo e abjeto que seja, tem gente que se compraz com a violência. Não me refiro aos criminosos que pontificam nos noticiários criminais. Estes são fáceis de execrar. Quanto a estes, é fácil mobilizar a opinião pública em torno de castigos medievais e eliminação. Eu me refiro a uma outra categoria de sociopatas — pois é nada mais, nada menos isso que são —, que talvez não cheguem ao ponto de cometer atrocidades, mas que são perniciosos, porque adotam a técnica do cupim (roem a madeira por dentro, deixando o exterior com aparência de normalidade) e, por isso, convivem normalmente conosco, por toda parte. Com estes, trocamos sorrisos e apertos de mão. São cidadãos de bem. São perniciosos, também, porque passam adiante as suas convicções.

Como identificá-los? Muito difícil. É preciso estar atento aos mínimos gestos, a expressões faciais, a aberturas de boca para começar a soltar uma frase que, no entanto, é cerceada. Esse tipo de doente sabe que sofrerá reações, por isso se protege. No silêncio ou no anonimato.

Às vezes, falando para várias pessoas, solto uma afirmação contundente e corro os olhos pela assistência, a fim de testar as reações. Por exemplo, digo que todo homem que bate numa mulher é um calhorda. Ou então lembro Nelson Rodrigues, para quem havia apenas duas categorias de mulheres: as que não gostam de apanhar e as normais. E aí encaro. Se uma sombra cruel surgir no rosto de alguém, ou um sorrisinho cínico, posso supor que ali está a discordância, a denúncia de um caráter que não se quer dar a conhecer.

Digo estas palavras porque a violência contra a mulher está longe de acabar, por um motivo simples: há pessoas firmemente convencidas de que as mulheres gostam de ser violentadas. Moral, física e sexualmente. Adoram, procuram por isso. Mas não têm coragem de admiti-lo. Diversas vezes surgiram, aqui no blog, comentários do gênero. O último deles, rejeitado hoje, ligado à postagem "Os labirintos do estupro", de ontem. Afirmava que toda mulher quer ser estuprada. Só não admite.

Minha leitura sobre isso? A afirmação parte de um homem — anônimo, claro — que adoraria estuprar uma mulher. Mas não pode fazê-lo ainda. Os fatores de contra-estímulo criminal para ele ainda são mais fortes. Ainda. Nada que uma vítima indefesa e um lugar propício não possam mudar, qualquer hora dessas. Uma criança, talvez, alvo preferencial desse tipo de agressão.

Cansado desse tipo de manifestação, inaugurei a Janela do bom senso, que você vê a partir de hoje aí à direita. Claro que não me livrarei dessas criaturas. Pelo contrário, nos próximos dias devo receber uma enxurrada da comentários os mais virulentos, ameaças, etc. e tal. Quem os escrever não dirá seu nome, mas deixará seu verdadeiro perfil (além de seu IP). Estejam cientes, antecipadamente, de que assim que vislumbro a ofensa no comentário, deleto-o. Eles não me afetam nem me preocupam. Para doido, doido e meio.

Não escrevo para estes, mas para as pessoas verdadeiramente de bem que frequentam este blog. Especialmente para as minhas leitoras, amigas, alunas. Aprendam a identificar esse tipo de gente. Informem-se sobre leituras comportamentais, linguagem corporal, coisas do gênero. Façam seus próprios testes. Cuidem-se. Porque os loucos de todo gênero estão por toda parte, sorrindo e dissimulando. Antecipe-se a eles.

6 comentários:

Auíri Au disse...

E ainda tem gente que diz que maltrata as mulheres por amor...
Por favor, essa ramificação do amor prefiro não conhecer!!
Devemos tanto a essas maravilhosas criaturas que se fazem presentes nas nossas vidas, sem elas o mundo realmente seria preto e branco.

Belo espaço...



Auíri Tiago



luz

morenocris disse...

Não é tão fácil Yúdice. Só com a convivência que se percebe. Em um mês você é capaz de identificá-lo. Mas, os danos serão terríveis, apesar do pouco tempo. Engraçado que ontem à noite, quando estava indo para casa, no carro da Cultura, eu, Deocley Machado e Floriano(mais com este), falávamos sobre isto. Sobre os loucos que surgem em nossas vidas, travestidos de "normais". Sei o que estou dizendo. Dai a minha solidão.

Beijos.

Yúdice Andrade disse...

Obrigado pela manifestação e pela aceitação, Auíri. O espaço está à sua disposição.

Nunca pensei que fosse fácil, Cris, por isso a necessidade de cautela e atenção. Sem que isso signifique, por outro lado, mergulhar numa paranóia que inviabilize a vida.
E não precisa ser tão só. Há muita gente maravilhosa no mundo.

Frederico Guerreiro disse...

Posso até imaginar o CEP. Mas acalme-se. É alguém que um dia se irá para sempre, desaparecerá ofuscado por sua própria mediocridade. Esses tipos são os iconoclastas, incapazes de fazer distinção entre um tijolo e uma obra de arte (geralmente muito jovens). Seus pares são realmente cupins de nobre madeira quando se avoram a falar. A única chance de serem lembrados por suas sociedades, no futuro, é na política arrebatadora de néscios; ou pelo dinheiro que atrai bajuladores. Lembrados para serem esquecidos.
Contudo, censurar-lhes o direito de dizerem o que pensam, ainda que seja algo mais do que deselegante, pode soar como censura, o que não é de todo aconselhável a quem preza por princípios democráticos. Afinal, só poderemos oferecer defesa ao que se sabe onde está. É por isso que tenho por lema a liberdade de expressão, minha detectora de imposturas e descomposturas, às vezes minhas próprias. Privar-me de indentificá-los só põe em desvantagem a mim e aos que me têm empatia. É privar-nos de vê-los com clareza.
Pudera receber algo que me deixasse irresponsável. Faria meu treino de autocontrole para a vida inteira. Na falta, busco no cotidiano meus inimigos que nunca tive de fato, salvo certo estelionatário.

Muitas vezes parti para o combate franco. Porém, certa vez um sujeito achou que era melhor do que eu. E o que fiz? Fiquei calado e esperei que ele próprio se destruísse perante os outros. Ele se autodestruiu, sem que nenhum jactancioso lhe tomasse as toscas palavras. Em suma, peço-lhe que não nos prive de identificar o mal. Libere-os e deixe que se destruam por si.
Afinal, "podemos não concordar com uma palavra do que dizem. Mas defendamos o direito de dizerem".
Abraço

Frederico Guerreiro disse...

arvorar

Anônimo disse...

Eu acho que comentários que exaltem a agressão às mulheres (existem abestados que o fazem) devem sim ser deletados. Infelizmente, esses abestados já têm bastante espaço para se pronunciarem, em sites apócrifos e absolutamente nocivos espalhados por aí.
Beto Carepa