quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Exemplos dos pais

Estou convencido de que minha esposa está certa quando diz que deveria haver uma espécie de carteira de habilitação para que pessoas pudessem se tornar pais ou mães. Quanto mais histórias escuto, mais temo pelo futuro de nossa sociedade.

1º caso
Uma amiga procura uma nova escola para o seu filho de quase quatro anos, que não deseja permanecer na que frequentava. Ela mora de cara para uma das escolas infantis mais famosas de Belém. De cara, mesmo: basta atravessar a rua. Mas nunca quis colocar o filho lá ela, que também é educadora , para poupá-lo de um ambiente elitista e, quiçá, preconceituoso. Diante da nova conjuntura, resolveu dar mais uma chance e voltou a visitar a tal escola. Continua adorando o lugar, mas não vai matricular seu filho lá. É que, ao conversar com outra mãe, soube que esta dera uma instrução de convivência para sua filha: a menina chegara em casa dizendo que uma coleguinha se vangloriara das coisas que possuía por ser "rica" e que certas pessoas apenas fingiam ser ricas. Qual foi a instrução dada pela mãe? Diga a essa menina que você é rica também!

2º caso
Um novo colega de docência, que conheci ontem, durante reunião em que falávamos não por acaso sobre a ética (ou falta dela) no comportamento dos estudantes, comentou um episódio ocorrido na sala de aula de seu filho, em outra escola, menos badalada, mas também muito conhecida. Ao final de uma aula de arte, a professora pediu que as crianças ajudassem a limpar e arrumar a sala. Nada mais natural. Contudo, no dia seguinte, um pai indignado procurou a direção da escola. Protestou dizendo que sua filha não é faxineira e exigiu que a escola arranjasse uma faxineira para limpar suas salas.
A diretora ainda tentou explicar as características da aula de arte e os valores envolvidos no processo educacional, que não visavam a transformar criança alguma em faxineira, mas o pai era carne de cabeça.

Gente arrogante. Gente podre, que se acha melhor do que os outros. Gente que define a vida por cifrões. Gente que não valoriza o trabalho. Gente mesquinha, que desconhece os conceitos de igualdade e de respeito.
Gente assim deveria ser proibida de ter filhos e de repassar, a estes, valores invertidos que os farão ser, no futuro, pessoas detestáveis. Semelhantes aos pais.
Nunca quis mandar minha filha para a escola muito cedo. Não quero transferir uma parcela e um momento de educação que devem ser realizados pela família. Hoje, entretanto, percebo um elemento antes inconsciente em mim: estou tentando retardar o momento de ter que enfrentar este tipo de situação. Sempre soube que a vida escolar de Júlia será um estresse para mim. Minhas concepções de educação, de justiça e de cidadania não se coadunam com o que vejo nesta cidade. As primeiras a fazer besteira são as próprias escolas, que hoje não disciplinam, pois não querem contrariar os pais-pagadores que, como os dois acima, não têm condições morais de educar uma criança. O dinheiro fala mais alto. As escolas aderem de forma servil a essas distorções.
Mas pior do que as escolas são os seus frequentadores. Não as crianças, que aprendem o que lhes é ensinado. Os pais!
Sinto que a vida escolar de Júlia pode abreviar os meus dias sobre a Terra...

10 comentários:

Frederico Guerreiro disse...

É como eu disse: o pior risco ao direito é o ser humano.
A empáfia também me enoja.
O triste de tudo será ver esse tipo comportamento se repetir no futuro, eis que ensinado à criança desde cedo.

Liandro Faro disse...

MEU DEUS DO CÉU, QUE CASOS MAIS GROTESCOS!..

ESSES PAIS PODERIAM PELO MENOS LER QUALQUER LIVRO DO IÇAMI TIBA, OU PELO MENOS A "ORELHA" DO LIVRO.

JÁ SERIA SUFICIENTE PARA PELO MENOS NÃO DIZER: "MINHA FILHA, REVIDE NA MESMA MOEDA E DIGA QUE É RICA ATÉ O 'TALO'"...

Polyana disse...

Não esqueça que o comentário feito à amiguinha no seu primeiro caso foi que ela é rica, mas tem gente que só finge ser rico... E a tal mãe não suportou a idéia de ser chamada de alguém que finge ser rica...
Lástima, lástima.

Yúdice Andrade disse...

Fred, se estão ensinando, é porque querem que as crianças se tornem iguais a eles. Deprimente!

Grotescos, Liandro, porém cada vez mais cotidianos e encarados com normalidade pela detestável classe média brasileira, ainda mais numa província como Belém do Pará.

Valeu a lembrança, Poly. Já modifiquei o texto.

Ana Miranda disse...

E por isso que alguns adolescentes não respeitam seus pais.
A educação que eles lhe deram, não incluiu respeito ao próximo.
O problema é que essas crianças crescem e aí nem seus pais lhes aguentam.
É por isso que esse mundo está cheio de "rebeldes sem causa".
Educação e respeito vêm do berço.
Não há como isolarmos nossos filhos, a única coisa que podemos e devemos fazer é educá-los.
Nossos filhos serão quando adultos, o reflexo da educação que lhe damos quando crianças.
Posso parecer até uma pessoa metida, mas meus filhos já cresceram, então posso falar com conhecimento de causa, ele tem 26 anos, ela está prestes a fazer 21 e não tenho, nem nunca tive problemas com nenhum dos dois.
São excelentes pessoas, que só nos dão orgulho, pois foram muito bem educados.
Conhecem seus limites e respeitam o dos outros.
Educar é tudo. Sempre dialoguei, e muito, e olha que eu sou uma mãe bem louca e eles são super certinhos. Os dois!!!

Yúdice Andrade disse...

Ana, peço a Deus todos os dias que, no futuro, eu possa dizer algo semelhante!

Ana Miranda disse...

Com certeza dirá, pois o reflexo do que a pequena Júlia será quando crescer, está hoje no amor, diálogo, carinho e respeito que vc e a Polyana dão a ela.

Luiza Montenegro Duarte disse...

Entendo bem o que o senhor está falando. Passei os últimos anos da minha vida escolar no badaladíssimo Colégio Marista Nossa Senhora de Nazaré. Confesso que até gostava de lá, meus melhores amigos são daquela época (como a minha amada Tônia, que fez uma referência a mim por aqui, dia desses) mas hoje, relembrando, tenho consciência dos abusos, da pressão por se usar as melhores calças, os melhores sapatos, bolsas, etc, além da submissão dos professores e diretores.
A busca pela popularidade e a humilhação de quem não se enquadra é uma realidade.
Acho que ajudou pra que eu saísse incólume o fato de, durante a minha formação básica (lá nos primórdios, onde formamos boa parte da nossa personalidade), ter estudado no NPI, a escola da UFPA, e dividido a sala com filhos de professores e servidores de todas as classes sociais e níveis de escolaridade. Ser "rica" (como eu era, pros padrões de lá), era até meio constrangedor...
De qualquer forma, professor, a família é a base de tudo. São eles que de fato nos mostram o que importa nessa vida.
Pode até ser que a pequena Júlia se veja tentada a aderir à futilidade, especialmente na famigerada adolescência, mas uma família ajustada consegue reverter isso e ela sem dúvida se transformará em uma mulher de bem!

Anônimo disse...

É, Yúdice. Este problema envolve todo o Brasil, não somente parte dele.

Minha noiva é Psicopedagoga e tinha tudo para dar certo como professora da juventude. Porém, hoje tem aversão à própria área, por conta desse povo mesquinho e ignorante, que acha que porque está pagando possui o direito e capacidade moral ou intelectual para julgar os métodos de ensino de uma instituição.

Alexandre

Yúdice Andrade disse...

Deus te ouça, Ana!

Teu depoimento sobre os colégios onde estudaste, Luiza, me ajuda a consolidar certas impressões que já possuía. Felizmente, dentre as influências sofridas, soubeste optar pelas melhores. De se lamentar que nem todos façam o mesmo.

Lamento, Alexandre, que a experiência dela tenha sido negativa a esse ponto. Mas compreendo como as coisas chegam a esse ponto. Espero que comigo seja diferente. Tem sido.