Como pai, maltratam-me bem mais do que antes notícias como esta, em que uma recém-nascida foi largada pela mãe em um canavial, no Município paulista de Ourinhos. No chão, a criança estava cheia de formigas e mosquitos, mas felizmente passa bem após o atendimento médico.
Não há muito o que dizer sobre o fato em si. Ele aflige qualquer alma sensível, mas também é preciso pensar nas razões que levaram a mãe a um ato tão infeliz. Pode não justificar, mas não serei eu a demonizá-la.
Por outro lado, como professor de Direito Penal, preciso destacar um erro na reportagem. Lá vai a dona imprensa, de novo! A notícia termina dizendo que o crime de abandono de recém-nascido é punido com pena de detenção, de seis meses a dois anos. O que não sabe o jornalista responsável é que o crime em apreço (art. 134 do Código Penal) somente se aplica às mães que abandonarem seus filhos "para ocultar desonra própria", algo inconcebível nos tempos atuais, mas que fazia algum odioso sentido na época em que o Código Penal foi elaborado. Naqueles tempos, a moralidade sexual era tão rígida que a lei admitia uma punição branda à mulher que abandonasse a prova de seus pecados.
Já passou da hora de eliminar esse monstruoso tipo penal de nossa legislação. Seja como for, em toda e qualquer situação em que o motivo de honra não esteja presente, como na hipótese de a mãe ter abandonado o bebê por razões financeiras, o crime é outro, de abandono de incapaz (CP, art. 133), para o qual a lei comina pena de seis meses a três anos de detenção, se a vítima não sofrer maiores danos, como é o caso. Sendo que, neste caso, como a mulher abandonou a própria filha, a pena deverá ser aumentada em um terço, rendendo-lhe uma condenação de, no mínimo, oito meses e, no máximo, quatro anos de detenção.
Que mundinho este nosso...
3 comentários:
É por essa, e por outras, que eu sou totalmente a favor do aborto.
Falando em imprensa, você viu o caso daquela enfermeira que ao cortar o curativo de uma criança de 1 ano, cortou a ponta do dedo da criança?
Olha, não estou defendendo a auxiliar de enfermagem, não é isso, a imprensa fez um alarde tão grande em torno do caso - que não foi proposital, ok, foi um descuido, mas não foi de propósito - e ainda mostraram a imagem da coitada da mulher.
Aí eu fico pensando:
"Será que esses repórteres(?) não imaginam que essa mulher pode ter filhos, marido, pais e a confusão que eles causam em transformar o fato em um circo pode atrapalhar o resto da vida profissional dela?"
Eles ficam incitando a família a xingar, a ficar mais revoltada do que ela já está.
Acho que ela tem, sim, que pagar pelo erro dela, mas não precisa ser execrada pela opinião pública.
Sei que acontecem muitos erros médicos, muitos por imperícia, por desinteresse, mas até que se apure os fatos não acho correto a imprensa ficar divulgando imagem.
Sempre lembro da Escola de Base, de Brasília, ocorrida nos anos 90, que destrui a vida de várias pessoas e todas eram inocentes.
Realmente, algumas coisas hão de ser vistas e alteradas no CPB.
Concordo que a hermenêutica à luz da sociedade atual é completamente distinta, sendo necessária a revisão do CPB. Mas não podemos condenar os movimentos de reforma, afinal de contas já foi extinto o crime de Rapto, no qual se sequestrava mulher honesta era crime.
Só discordo quanto aos motivos da necessidade de alteração. Da mesma forma que o crime de Rapto foi extinto, afinal não existe mais mulher honesta; as mulheres também não tem mais honra, não tendo o que esconder.
Não sei o abortamento voluntário seria a solução para casos assim, Ana. Ainda insisto na necessidade da educação para o planejamento familiar, mas sei que esse é um caminho bem mais longo e difícil.
Estamos de acordo quanto à necessidade de prudência para lidar com certos assuntos.
Das 17h47, não entendi os termos de tua discordância. E é preciso cuidado ao afirmar que "não existe mais mulher honesta". Não foi esse o teor do meu texto.
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