quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Culpa concorrente

Interrompo momentaneamente a licença-blog para destacar uma decisão que acabou de ser tomada pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça e que pode interessar ao exército de lesos que habitam esta cidade de Belém, que insistem em atravessar ruas fora das passarelas disponíveis ou de andar ou pedalar fora das ciclovias e ciclofaixas, embora elas estejam bem ali ao lado.
Ao apreciar um caso em que um ciclista foi atingido por um trem, ao cruzar de bicicleta uma via férrea em Praia Grande, Município do Estado de São Paulo, a 100 metros de uma passagem de nível, o STJ decidiu ter havido culpa concorrente da vítima em seu próprio atropelamento.
Sabemos que a culpa concorrente não afeta a responsabilidade penal: o autor da conduta configuradora de homicídio ou lesão corporal continua respondendo pelo delito, embora lhe favoreça o comportamento da vítima para a dosagem da pena. No entanto, o caso em apreço diz respeito a responsabilidade civil, estando em discussão os pleitos da viúva, de indenização por danos morais e de pensão mensal, até a época estimada para o falecimento do marido, caso não tivesse ocorrido o sinistro.
A ré (União, sucessora da extinta Rede Ferroviária Federal S/A) não se livrou da condenação, mas viu-a ser significativamente reduzida. E isso só ocorreu porque o relator do recurso, Ministro Aldir Passarinho Júnior, proclamou que a legislação vigente obriga o gestor da ferrovia a manter cercas, muros e sinalização adequada, “notadamente em locais populosos, para evitar o acesso de pedestres ou veículos à linha férrea, existindo, desse modo, responsabilidade da concessionária pela presença de transeunte no local, cuja vigilância deve ser exercida pela prestadora do serviço público”. A existência da passagem de nível não eliminou a responsabilidade da concessionária pois esta deveria fechar todo e qualquer acesso à linha, inclusive os abertos de forma clandestina pela população. Destaque-se que o Tribunal de Justiça de São Paulo, antes, decidira que o ciclista tivera culpa exclusiva pelo acidente.
Portanto, meus e minhas, pensem duas vezes antes de se lançar à frente dos insanos motoristas belenenses. Afinal, a responsabilidade civil do poder público é objetiva, mas a do cidadão comum exige a demonstração de culpa. Logo, o atropelado que pense em se aposentar às custas do atropelador pode ter uma grande surpresa.

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