Esse sujeito aí ao lado é Álvaro Fernandes Dias, 66 anos, nascido no Município paulista de Quatá, porém criado em Maringá, Paraná, Estado que o elegeu deputado estadual, deputado federal por dois mandatos, governador e senador também por dois mandatos. É afiliado ao PSDB e, nessa condição, tem sido uma das vozes mais combativas da oposição aos governos federais petistas. Uma de suas principais pautas? A moralidade administrativa, aquele velho tema de que todos os políticos gostam de falar, mas não de praticar.
Apeado do poder nas últimas eleições e estando a dez dias de ficar sem mandato, o honorável político encontrou um jeito de não perder a boquinha totalmente. A solução foi requerer, ao Estado do Paraná, que lhe pague valores alusivos a sua aposentadoria como ex-governador. Valores retroativos que importariam em 1,6 milhão de reais.
Não conheço a legislação que rege esses benefícios, ainda mais por se tratar em parte de legislação do Estado do Paraná, embora possa afirmar que ela normalmente é elaborada de modo a que, nas imprecisões e entrelinhas, favoreça a máxima acumulação de riquezas pelos espertos. Mas posso tentar uma crítica baseado, ao menos, no bom senso e em regras jurídicas mais gerais.
Quando a Constituição de 1988 veda a acumulação de cargos públicos, ela está, na verdade, vedando a acumulação de remunerações públicas (art. 37, XVI). Não se pode auferir rendimentos públicos cumulativos, salvo as hipóteses previstas naquele dispositivo, que envolvem atividades de magistério ou na área de saúde. Por isso, se Álvaro Dias tinha direito a proventos de aposentadoria como ex-governador, tudo bem, que recebesse seus haveres. Mas ao assumir um mandato de senador, precisaria optar entre aqueles proventos e o subsídio de senador. Obviamente, escolheria o que fosse maior, no caso, a remuneração paga pelo Senado.
Trata-se, portanto, de uma renúncia — temporária, é certo, mas uma renúncia — à aposentadoria, enquanto estivesse no Senado. Findo o seu mandato, poderia voltar a receber seus proventos. Não sofreria prejuízos, pois durante todo esse tempo o dindim esteve na conta. Ao pedir proventos retroativos, o espertíssimo ainda senador joga por terra duas vedações constitucionais: a de acumulação de rendas e a do teto máximo de remuneração a ser paga aos agentes públicos.
Contando com a burrice alheia (ou com a conivência de quem de direito), ele pensa que, recebendo tais valores num momento em que não tem mais o subsídio de senador, o óbice estaria superado. Mas, ora pois, se os valores são retroativos, isso significa que não apenas o dinheiro em si, mas o fato gerador de seu pagamento remonta ao passado. Se esse pagamento for feito, estarão dizendo, tacitamente, que Dias tinha direito a receber aposentadoria como ex-governador cumulativamente com o subsídio de senador.
Não podia no tempo presente, mas poderia se for assim, na base do arranjo?
Ah, eu adoro ver essa gente mostrando quem realmente é! Pena que esse tipo de informação circule pouco na imprensa e, ainda que tenha maior divulgação, não chegue a impressionar o cidadão comum que, no fundo, não vê tanto mal assim no patrimonialismo desenfreado dos políticos brasileiros. Até reclama, mas endossa os mesmos caras com o seu voto.
3 comentários:
Yúdice, e o dito cujo 'tucanalha' ainda deu entrevista tentando se justificar, pois "é um direito seu". Tão Brasil.
Conforme o meu texto, não há direito algum. Mas é como diz o meu irmão: depois que inventaram a desculpa, o mundo se tornou um lugar maravilhoso para se viver!
É como dizem: "o enredo não muda, o que mudam são os atores." Lógico que tirando as exceções. Ótimo post prof.
Um abraço, Ricardo Meira
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