A cena já aconteceu diversas vezes: a prisão preventiva de uma pessoa é decretada e alguma autoridade alerta que o indivíduo tem até tal dia, tal hora, para se apresentar, senão será considerado foragido. Essa condição, até hoje, tende a ser considerada desfavorável ao acusado, inclusive a ponto de ser uma implícita confissão de culpa — embora, naturalmente, não haja a menor base legal para isso.
A 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, contudo, proferiu nesta segunda-feira (2 de setembro) uma decisão que pode mudar essa praxe. Acolhendo voto do Min. Cezar Peluso, o colegiado decidiu que ninguém pode ser considerado foragido se nunca foi preso. Ou seja, foragido é apenas aquele que se evadiu da prisão, não aquele que deixa de se submeter a ela — situação que, no processo, poderia no máximo ensejar a revelia do réu.
A decisão não é final, porque proferida por uma turma do STF, não por seu pleno. Em tese, pode ser modificada. Mas se esse entendimento se firmar, vai piorar e muito a gastrite dos delegados de polícia, pelo país afora, pois ficarão desprovidos de um dos seus argumentos para prender.
Aguardemos a repercussão.
2 comentários:
De fato, caro professor, muitas prisões preventivas são decretadas por conta da fuga do réu, sob o fundamento de garantir a aplicação da lei penal. Acredito equivocado o argumento do Min. Peluso. Não importa se o réu fugiu ou não da prisão, mas sim se ele teve a intenção de se furtar à aplicação da lei penal, que independe de estar ou não encarcerado. É mais uma contribuição à cultura da impunidade.
Meu amigo, não são recentes os precedentes do STF sustentando que a fuga é um direito natural do indivíduo, que assim protege a sua liberdade. Que a fuga, por si só, não autoriza a decretação da prisão. Creio que a decisão ora sob comento acrescenta mais um aspecto ao tema - o conceito de foragido -, sem todavia ser exatamente original.
Sem dúvida, a decisão se alinha às interpretações do Direito Penal sob a ótica constitucional, que tanto incomodam aqueles que estão na linha de frente do sistema de justiça criminal, notadamente polícias e Ministério Público. Há muito o que conversar para se chegar a um consenso, que seja bom para o inseguro povo brasileiro.
Gratíssimo por mais esta contribuição ao blog.
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