Agora batizado de Aprendiz 6: universitário, o reality show da Record é o único programa do gênero a que assisto. E ainda por cima gosto bastante, o que não deixa de surpreender a mim mesmo, considerando a minha aversão natural a questões ligadas ao mundo dos negócios e afins. Quanto ao apresentador, por mais marrento que seja Roberto Justus — o que deve ter algo de fachada, também, por causa da natureza do desafio —, não se lhe pode negar a condição de profissional muito bem sucedido e dono de uma estrutura que lhe permite comandar o programa.
No ano passado, eu já escrevera algumas palavras gentis sobre O aprendiz, inclusive elogiando a iniciativa de que a edição seguinte envolvesse estudantes universitários.
No episódio de ontem, o acadêmico de Direito Rutênio Nogueira foi demitido, com justa razão, após prestar um desserviço a si mesmo: acusado pela líder Rebeca Romero de ser um grosseirão, o arretado Rutênio deu um tiro no pé ao dizer que ela não gostava de pensar. Uma deselegância e uma inverdade que, naturalmente, acabou por confirmar a acusação por ele sofrida.
Rutênio foi demitido graças à conjugação de pelo menos três fatores: o fraco desempenho desde o início da competição (e particularmente na sexta prova), o gesto infeliz na sala de reunião e uma carta escrita por ele para Rebeca, na qual cometeu um barbarismo — escreveu "escultar" em vez de "escutar". Justus foi impiedoso e disparou: "Você tem certeza que está na faculdade?" A carta com o erro ortográfico em letras garrafais ganhou destaque nos sítios relacionados ao programa.
Para o apresentador, estar no ensino superior implica em que essas questões comezinhas já deveriam estar superadas. Ele tem toda a razão, mas o que mata é esse futuro do pretérito. Há quase dez anos corrigindo montoeiras de provas — e tendo concluído mais alguns calhamaços há apenas uma semana —, convivo com a tristeza de ver como escrevem mal os alunos dos nossos dias. A generalidade deles. E escrevem muito mal. Muitíssimo mal.
O pior é que, lecionando numa faculdade particular, que recebe alunos egressos de um ensino médio igualmente privado, constato que o mito sobre as boas e tradicionais escolas da cidade não se sustenta nos fatos. A falta de intimidade com a Língua Portuguesa não se explica pelas mazelas do ensino público. E como muitos alunos se destacam pela inteligência, sou levado a concluir que o problema está, de fato, na formação que receberam. Não exatamente na qualidade da aula que lhes foi oferecida, mas provavelmente na capacidade da escola de fazê-los compreender a importância dos conteúdos, para que eles se preocupassem em efetivamente assimilá-los.
A questão permite uma discussão quase interminável que, obviamente, não será feita aqui. Fica esta postagem como um desabafo e um apelo, aos estudantes que por aqui passarem, para que tenham a humildade de reconhecer essa carência e a preocupação em superá-la. Nos tempos de nossos avós, até quem não concluía os estudos falava muito melhor do que qualquer estudante atual. Afirmo-o porque convivi até com analfabetos.
2 comentários:
Yúdice, tens plena razão. A escrita dos acadêmicos - não sou professor, mas convivo com muitos deles no meu dia-a-dia profissional, tanto na PGE como no escritório - é pobre, sem vocabulário, com erros crassos de ortografia e pontuação. Estilo, então, é artigo de luxo - um relógio Patek-Philippe ou uma bolsa Prada do texto universitário. Pode parecer preconceito, mas não me furto de pensar: se no curso de Direito, cujo principal instrumento é a palavra, é assim, faça-se uma ideia do que ocorre nos cursos universitários de outras áreas que não a de Humanas...
Falta humildade também ao acadêmico. Diante da insatisfação do docente para com seu texto, o aluno em geral reage pensando que não está ali para ter aulas de português, mas do curso específico que escolheu.
Tenho um exemplo a dar, sobre humildade e crescimento profissional, que depõe muito também sobre o caráter de quem viveu esta história.
Na PGE, quando fazia parte do Conselho Corregedor, participei da avaliação de um colega em estágio probatório. Advogado experimentado, responsável, criativo, dedicado e, ademais, devidamente aprovado em concurso, o único senão que recebeu da comissão avaliadora sobre seu primeiro ano de atuação funcional foi justamente a respeito de seu texto. O rapaz precisava melhorar o português. No relatório de avaliação, foi considerado apto a continuar exercendo o cargo, com a sugestão de que melhorasse seu desempenho no manejo da língua.
Qualquer pessoa "normal", digamos assim, ficaria profundamente ofendida em seu brio e tocaria a dar botinadas no Conselho. Qual foi a reação de nosso colega? Escreveu uma moção aos corregedores, agradecendo o apoio e a dica e prometendo esforçar-se para melhorar. Matriculou-se em um curso de redação (desses pré-vestibulares), compromou uma gramática e dedicou-se a suprir sua falha.
Ano seguinte, na 2a avaliação de desempenho, recebeu um conceito "apto" com registros de louvor. Superou visivelmente sua dificuldade e hoje, já estabilizado no cargo, é um dos melhores procuradores da Casa.
Por que nossos acadêmicos não fazem o mesmo?
O caso que retratas é tão especial que merece uma postagem específica. Obrigado.
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