sexta-feira, 3 de abril de 2009

Para esses, não falta solidariedade

A Associação dos Advogados de São Paulo, que raramente se manifesta sobre assuntos políticos, saiu de sua comodidade para emitir uma nota com o seguinte mote: a aplicação da lei penal está desvirtuada no país.
Uma obviedade, mas como é também raro alguém se lembrar dos desprovidos da fortuna e da sorte, cliquei no link para ler a matéria. Mas me deparei com coisa muito diferente do que, em minha ingenuidade, esperava encontrar. No entanto, é forçoso dizer que me deparei com a hipótese mais plausível: a AASP não criticou a lei penal para defender a clientela habitual do sistema de justiça criminal, e sim os clientes eventualíssimos.
Lá está um libelo em favor dos mega-empresários da Daslu e da Camargo Corrêa, bem como dos próprios advogados. Um libelo em favor dos iguais. Não há, na nota pública, nem na mais remota entrelinha, um só resquício de preocupação com o espetáculo de prisões desnecessárias, excessivas e sem fundamentação que os juízes aplicam diariamente.
Estremecem, os advogados paulistas, por causa da pena quase centenária dos Tranchesi, mas nada dizem acerca dos incontáveis fulanos condenados a mais ou menos uma década de prisão, em regime fechado, porque usando uma faca levaram dez reais de alguém na rua.
O desvirtuamento, a panfletagem, o sensacionalismo e a truculência existem, nesses casos e pelo visto somente nesses casos , porque os atingidos são a elite do país. Para estes, há Estado Democrático de Direito, necessidade de decisões justas e equilibradas e princípios constitucionais. Tema tão velho, é exaustivo repetir esta crítica.
Gostaria de ver uma nota da AASP sobre as mulheres exemplarmente condenadas por tráfico de entorpecentes, porque levaram, na vagina, um punhado de maconha para seus companheiros presos. Ou sobre abusos policiais que não tenham advogados como vítimas. Ou sobre a total desassistência jurídica da população carcerária. Não, sobre isso a sexagenária confraria não se manifesta.
Em que pese uma certa pertinência (eu, p. ex., ainda não me convenci de que a pena aplicada aos Tranchesi esteja correta; além disso, sabemos que a PF volta e meia abusa, sim), a nota em apreço não merece respeito, por não revelar senão o espírito de convescote, ao invés de se importar com a tal de justiça, citada em seu texto, mas claramente ignorada.
Lastimável.

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