quinta-feira, 26 de junho de 2008

Alcoolemia zero

Lei n. 11.705, de 19.6.2008. Anotou? Esse é o diploma que, em vigor desde a sexta-feira passada, 20 de junho, vai torrar a paciência do brasileiro médio, que adora beber — e beber muito — e acha ridícula, injustificável e absurda qualquer restrição nesse sentido. Afinal, diversão só é possível se o sangue estiver turbinado, certo? Olha só a ementa da lei:

Altera a Lei n. 9.503, de 23 de setembro de 1997, que ‘institui o Código de Trânsito Brasileiro’, e a Lei n. 9.294, de 15 de julho de 1996, que dispõe sobre as restrições ao uso e à propaganda de produtos fumígeros, bebidas alcoólicas, medicamentos, terapias e defensivos agrícolas, nos termos do § 4o do art. 220 da Constituição Federal, para inibir o consumo de bebida alcoólica por condutor de veículo automotor, e dá outras providências.

O art. 1º da lei é ainda mais explícito, ao declarar ostensivamente a finalidade de estabelecer alcoolemia zero para os condutores de veículos. Além de confirmar a proibição da comercialização de bebidas alcoólicas ao longo das rodovias federais, salvo em áreas urbanas, o art. 165 do Código de Trânsito foi alterado, de modo que a infração gravíssima consistente em "dirigir sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência" passe a ser punida com mais rigor, com multa e suspensão do direito de dirigir por 12 meses, além da medida administrativa de retenção do veículo até a apresentação de condutor habilitado e recolhimento do documento de habilitação. Tais penalidades podem ser impostas qualquer que seja a concentração de álcool no sangue (CTB, art. 276).
Além disso, o art. 306 do CTB, que antes considerava crime a conduta de "conduzir veículo automotor, na via pública, sob a influência de álcool ou substância de efeitos análogos, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem", ganhou uma redação mais enfática: "conduzir veículo automotor, na via pública, estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência".
O motivo da mudança é não apenas fixar o limite mínimo de alcoolemia para efeitos criminais, mas também acabar com a brecha dos advogados, que defendem seus clientes dizendo que, mesmo alcoolizado, o condutor não expôs pessoas ou bens a danos potenciais, de modo que não haveria crime. Não, houve, porém, mudança quanto à pena: detenção, de 6 meses a 3 anos, multa e suspensão ou proibição de se obter permissão ou habilitação para dirigir. Mesmo assim, a lei está mais severa, porque a concentração de sangue autorizará a responsabilização criminal mesmo que o infrator não apresente sinais de comprometimento psicomotor.
A campanha furibunda contra a nova lei está no ar. O que não surpreende. Afinal, a indústria da bebida fatura horrivelmente e é uma das maiores clientes do mercado de publicidade. Por isso, acesse os grandes portais e lá encontrará uma série de matérias (supostamente isentas), criticando o novo rigor. Há também entrevistas com alguns juristas, apontando os diversos defeitos da lei. Não duvido que eles existam, aqui e ali, mas me pergunto antes se esses entrevistados não são chegados num whisky, num happy hour regado a cerva.
Acima de tudo, a lei é muito dura, sim. Mais do que as congêneres de quase o mundo todo. Que seja. As estatísticas europeias, asiáticas e norteamericanas de desastres no trânsito são muito inferiores às nossas. Logo, esses países de uma lei como a nossa. A dureza dela é diretamente proporcional ao nosso número de mortos, mutilados, incapacitados, órfãos, aposentados por invalidez e pensionistas do INSS, que odeia gastar dinheiro com os fins para os quais o dinheiro lhe foi destinado.
Esta situação me provoca um sentimento de triunfo. Nas minhas turmas de Penal I, na primeira aula, começo explorando o desejo generalizado de que as leis penais sejam endurecidas. Esses discursinhos exaustivos de que bandido bom é bandido morto, que já pipocaram inclusive aqui no blog, algumas vezes. Então está aí: motorista bêbado é bandido. Vamos matá-los? Não. Claro que não. Porque a massa pensante brasileira — a classe média —, jamais concordará com isso. O trânsito mata mais do que os assaltos, mais essa lei não pode ser endurecida de jeito nenhum.
Não posso negar que estou adorando ver a hipocrisia brasileira desvelada e em desvantagem.

4 comentários:

Anônimo disse...

Yúdice,

O ato de fumar já foi considerado glamouroso e até necessário, hoje é visto como algo repulsivo e nada inteligente.

Devagarinho, começa a ocorrer o mesmo com o ato de "beber socialmente". Em algumas décadas, estaremos livres da hipocrisia e o consumo de bebidas alcoólicas estará, enfim, no mesmo patamar do consumo de drogas como cocaína e ecstasy.

Soltei foguetes para a nova lei, pois nunca entendi a relação entre bebida e diversão. Álcool é uma ilusão que só engana quem tem a mente muito, mas muito fraca.

Em algumas rodas, sou considerado um verdadeiro alienígena por dizer "NÃO" ao álcool. Não vejo necessidade de beber e não aceito que imponham isso como pré-requisito para nada. Não bebo porque tenho consciência dos malefícios que a bebida provoca - acidentes automobilísticos fatais, vexames, brigas em família, traições e uma baita ressaca no dia seguinte.

É preciso ser muito otário, muito babaca e muito medíocre para seguir a cartilha das grandes cervejarias e destilados em geral. O mítico "Homem de Marlboro", que morreu de câncer no pulmão, está aí para não me deixar mentir.

Um abraço!

Adelino Neto

Anônimo disse...

Se beber, não dirija

A nova lei sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva determina que o motorista que for apanhado dirigindo com qualquer quantidade de álcool no sangue terá sua carteira de habilitação suspensa por um ano, pagará uma multa pesada e ainda terá seu carro apreendido, além de responder criminalmente, ou seja, ir para cadeia está causando muita polêmica.

Nosso País é recordista em leis. O brasileiro, agora, não poderá mais beber um drinque, um copo de vinho ou qualquer outro tipo de bebida alcoólica. Isso é um absurdo, é um desrespeito ao cidadão brasileiro, é cercear o direito de liberdade de um povo.

O Brasil é conhecido como um dos países mais corruptos do mundo. Essa nova lei certamente vai aumentar ainda mais essa fama, pois qualquer motorista que tenha ingerido apenas um copo de cerveja e for flagrado com teor alcoólico no sangue terá seu carro e sua habilitação apreendida. E ele mesmo fará de tudo para tentar se livrar da punição, ou seja, tentar se livrar através da corrupção, usando o famoso jeitinho brasileiro.

O motorista brasileiro agora não pode mais ir a uma praia, um aniversário ou qualquer festinha e beber sua cervejinha, sob pena de ter uma surpresa desagradável. A Justiça brasileira deveria punir com prisão os motoristas irresponsáveis que, sob efeitos de qualquer tipo de droga ou álcool, cometam acidentes de trânsito seguido de mortes. Isso sim é que deveria ser feito, e não colocá-los em liberdade, como temos visto neste País.

Nem bem a nova lei entrou em vigor e já está causando desentendimento entre os condutores e policiais. Segundo um especialista, o motorista que estiver ingerindo 'xarope' ou outro qualquer tipo de remédio feito à base de álcool, e pela infelicidade for flagrado em uma batida policial e se submeter ao bafômetro, certamente será enquadrado na forma da nova lei, ou seja, será preso, perderá sua habilitação, ficará sem seu veículo além de responder à Justiça pelos atos cometidos, pois qualquer dosagem alcoólica contida no sangue será fatal.

Eu só queria saber se os deputados, senadores, juízes, ministros e até o presidente Lula ou qualquer outra autoridade de nosso País não vão mais a uma festinha, a uma praia ou a qualquer outro tipo de reunião festiva onde haja bebidas. E nas praias? Será se o brasileiro vai cumprir e respeitar essa lei absurda e autoritária? Claro, certamente eles (os criadores dessa nova lei) têm seus motoristas particulares e podem beber à vontade.

Paulo Santos

Yúdice Andrade disse...

Adelino, infelizmente não tenho a mesma fé quanto a essa evolução que sugeres. O hábito de beber é muito mais disseminado e glorificado do que o de fumar. Enquanto um cai o outro aumenta (e o tabagismo, entre os jovens brasileiros, cresceu nos últimos anos, segundo noticiado pela imprensa). Gostaria muito que estivesses certo, mas neste momento ainda não acredito nisso.

Caro Paulo Santos, considerando que nossos pontos de vista são diametralmente opostos, agradeço a boa educação com que você expôs suas idéias. Farei uma postagem com elas e meus comentários contrários. E podemos continuar debatendo. Um abraço.

Polyana disse...

Palavras suas: "Se uma praia linda não vale nada sem bebida, se o meu amigo não vale nada a ponto de sua celebração de aniversário só prestar se tiver bebida, vá à praia ou ao aniversário e beba. Mas não dirija. Simples assim."
É por essas e outras que te amo.
beijos meus e de Júlia.