Promessa cumprida. Ana Júlia compareceu ao ato ecumênico localizado no local onde, na "curva do S", em 17 de abril de 1996, escreveu-se o massacre de Eldorado dos Carajás. A sua presença já podia ser considerada um marco na postura do governo frente a essa categoria de movimentos populares, mas ela foi além: pediu perdão ao povo paraense e reconheceu a culpa do governo.
Segundo o Diário do Pará, a governadora teria declarado: “A repressão ordenada por aqueles que governavam o Pará deixou 19 mortos, centenas de mutilados, envergonha a história do Pará”, disse, lembrando que os policiais cumpriam ordens dos comandantes e do ex-governador Almir Gabriel. “Soldados que apenas cumpriram ordens de quem não tem o mínimo de respeito pela vida humana”. Como era de se esperar, a cobertura de O Liberal foi omissa. Mencionou os fatos, a decisão de pagar as indenizações, mas não aludiu em momento algum, sequer superficialmente, aos nomes dos tucanos envolvidos ou à acusação direta feita contra eles pela governadora.
Naturalmente, o gesto da governadora desencadeará diversas e fortes reações. Quem estiver ligado à luta pela terra, enaltecerá sua atitude e terá, talvez, um alento contra o sentimento de impunidade. Os policiais militares — a raia miúda — se sentirão aliviados, pois se declaram publicamente bodes expiatórios de seus superiores hierárquicos, dos comandantes ao governador. Os defensores do tucanato a criticarão com furiosas acusações, mormente de populismo, já que o partido sempre esteve, no Estado, visceralmente atrelado à imagem do ex-governador, responsável óbvio pela tragédia, mas o primeiro a ser protegido. Aguardem manifestações raivosas nos plenários parlamentares.
E mesmo entre a população as opiniões serão muito controversas. Quem odeia os sem terra, quem está preocupado com a posse imobiliária (mesmo que dos outros), quem tem uma visão militaresca de ordem pública, quem nega aos cidadãos os direitos de organização, manifestação e até de resistência, certamente vesgastará a governadora. Demagogia deverá ser um dos argumentos. Afinal, fica fácil admitir a culpa do governo quando o governante já passou. Quero ver o sujeito admitir a culpa própria. Isso ela não fez. Muito menos o tucano.
No momento em que escrevo, pessoas ao meu redor a acusam de ter dado apoio aos sem terra e, por conta disso, vão explodir as invasões no Estado e muita gente morrerá. É a mentalidade pequeno-burguesa que faz o cidadão comum raramente se solidarizar com as minorias, mas ter uma adoração espontânea da classe média para cima, com cujo ideário se identifica. O problema disso é o maniqueísmo: todos os sem terra são vagabundos, baderneiros, desonestos. E todas as suas "vítimas" são empreendedores inocentes.
Enfim, também sou um pequeno burguês preocupado com carro, viagens de vez em quando, propriedade imobiliária, coisas assim. Mas levei a sério aquela história de função social da propriedade e realmente acredito que a riqueza individual precisa, de algum modo, repercutir na riqueza da sociedade, que distribua um pouco das benesses entre todos.
Agora é aguardar as consequências do dia de ontem. Boa sorte, governadora.
Um comentário:
Bom dia Yúdice, coisas da vida...
Um governador vai ao enterro de vítimas, outro pede desculpas, enfim, os governadores estão saindo do armário(palacete). Os acontecimentos externos os invocam. As vítimas entram nos armários(caixão). Violência em todo lugar. Invasão, destruição, confrontos, corrupção. E ainda dizem que são balas perdidas. Falam do medo. Da banalização. Das injustiças. Justiça? No banco dos réus. E o planeta também participa. Vai esquentando. Esquentando...
Bjs.
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