No último sábado, assisti a uma reportagem sobre falta de médicos no Município paraense de Curralinho. A certa altura, o repórter mencionou que moradores da cidade, ao saberem da presença de uma equipe da imprensa, apareceram para denunciar outros problemas; um deles, a falta de merenda na escola. A matéria então muda o foco e são mostradas imagens da escola, de fato sem alimentos para servir aos alunos e com graves problemas de infraestrutura e até mesmo de segurança sanitária.
Mas o que realmente me chamou a atenção foi quando surgiu a informação de que funcionários da escola se cotizavam, ocasionalmente, para comprar alimentos e com isso servir um lanche aos estudantes. O repórter procura enfatizar que os funcionários estão tirando dinheiro do próprio bolso e, num exercício retórico, pergunta se é isso que acontece. A resposta da merendeira vem rápida e com uma sinceridade, para mim, comovente:
— Sim, porque somos uma comunidade.
A mulher de aparência maltratada e modos que sugerem não ter sido, ela mesma, uma estudante no passado, dá-nos uma lição daquelas bem típicas da boa e honesta gente simples: um espírito de coletividade cada vez mais raro em nossa sociedade burguesa, ególatra e competitiva. Ela sabe que é a escola de seus filhos, netos, sobrinhos ou, mesmo que de nenhum de seus parentes, é a escola dos filhos de seus vizinhos, dos seus amigos, das pessoas com as quais convive e que sofrem, todo dia, as mesmas dificuldades que ela. O dinheiro — já pouco — que ela suprime de seus gastos pessoais é reinvestido na própria comunidade, numa perspectiva que ouso chamar de investimento de longo prazo: é para o bem de todos.
Passei o resto do dia com aquela merendeira na cabeça. No dia seguinte, recebi uma visita e conversei com ele sobre o assunto. Estava tomado por uma perplexidade que talvez se explique pelo fato de estar, há tanto tempo, alijado da vida simples que conheci em outros momentos e lugares. Vejam-se as pautas raivosas deste blog: cheias de reclamações sobre os psicopatas do trânsito, sobre os bares que invadem as calçadas, sobre agressões de todo tipo. Faltam textos sobre gente feliz, gente boa, gente que fez coisas grandiosas em sua simplicidade cotidiana.
Meu Deus, acho que estou precisando de férias em alguma cidadezinha do interior! Parece que as doenças mentais das cidades contemporâneas me encontraram.
2 comentários:
É isso aí!
Mas pense que denunciar as mazelas também´é senso de comunidade.
Sem dúvida alguma, Waleiska. Aliás, mesmo essa atitude ainda precisa ser fomentada entre a média da população.
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