sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Bajulação

É muito fácil encontrar quem ainda chame a Av. José Malcher de São Jerônimo (há vários ônibus com essa indicação nas placas de itinerário), a Av. Magalhães Barata de Independência e a Av. Bernardo Sayão de Estrada Nova. Há outros exemplos. Penso que o mundo gira e precisamos nos adaptar, por isso defendo a observância dos nomes atuais, que são definidos em lei.

Em 2005, contudo, quando a Av. 1º de Dezembro teve seu nome mudado a toque de caixa para João Paulo II, no contexto da histeria que tomou conta dos políticos religiosos de ocasião, dada a morte do chefe da Igreja Católica, fiquei enojado com o oportunismo e decidi que continuaria a chamar a via de 1º de Dezembro. Marra, eu sei. Excesso de opinião política. Mas o tempo vai passando e, hoje, alterno ora um, ora outro nome. Com o tempo, acabarei assumindo o fato consumado. Todavia, impende lembrar que o nome anterior do logradouro era uma referência à data de realização do Congresso Eucarístico, aqui em Belém, no ano de 1953. De certa forma, ambos os nomes tinham um mesmo contexto de homenagem ao Catolicismo — inadmissível num Estado laico, mas admitido pela generalidade das pessoas.

Hoje, porém, outra importante via da cidade muda de nome. Acaba a 25 de Setembro e surge a Rômulo Maiorana, exatamente onde está situado o portentoso prédio das Organizações ORM. Há muitos anos que se tenta impor à cidade de Belém esse aulicismo póstumo. Trabalhei na Câmara Municipal de Belém entre 1997 e 2000 e vi de perto as atitudes dos vereadores, principalmente do finado Eloy Santos, rendendo loas ao então mais forte grupo de comunicação do Estado. Eram frequentes. Demorou, mas a culminância enfim chegou.

Nada tenho pessoalmente contra o sr. Rômulo Maiorana, que sem dúvida foi um grande empreendedor. Fui professor de uma de suas netas, jovem adorável e inteligente, em cujo nome firmo o meu respeito e a minha consideração. Mas não acho que a cidade deva perder mais uma de suas referências históricas em prol da satisfação pessoal dos políticos que tantos malefícios já renderam a esta cidade, inclusive a majoritária sustentação do pior prefeito de todos os tempos, provavelmente de olho no proveito de afagar a mídia.

O bairro do Marco teve suas ruas batizadas com elementos referentes à Guerra do Paraguai — Chaco, Mauriti, Angustura (ou Angostura), Lomas Valentinas, etc. —, assim como o bairro do Jurunas presta homenagem a tribos indígenas — Tamoios, Mundurucus, Pariquis, Apinagés, etc. Isso expressa uma época em que as cidades, senão planejadas, ao menos eram pensadas de acordo com referenciais históricos, sociais, culturais, com tradições e valores merecedores de perpetuação. Hoje, cuida-se apenas de bajular pessoas, importantes para aqueles que têm o poder decisório sobre a toponomástica do Município (os vereadores), sem contudo perguntar-se aos cidadãos o que pensam.

Expressões mais graves e odiosas dessas práticas de subserviente oportunismo são, p. ex., a existência de uma "Jaderlândia" e o nome "Almir Gabriel" outorgado à mais importante ponte da Alça Viária, a um ginásio esportivo em Ananindeua (ao tempo em que a cidade era gerida pelo partido do ex-governador) e a uma comunidade que faria melhor figura se continuasse a ser conhecida como "Che Guevara". E, vale lembrar, a Escola de Governo ser batizada de "Simão Jatene" quando o cidadão em apreço ainda comandava o Executivo estadual. Tudo detestável.

25 de setembro para sempre!

4 comentários:

Anônimo disse...

Ei, e a Feira da 25, como vai se chamar? Já pensou???

Anônimo disse...

Caro Yúdice
Boas as tuas considerações. Quem sabe seja o caso de os vereadores darem uma lida( não demora muito e é fácil de entender) no livro do Ernesto Cruz, RUAS DE BELÉM. Quiçá poderiam, então, prestar justas homenagens a ilustres paraenses ou brasileiros do mesmo naipe que Veiga Cabral, Tomázia Perdigão ou Henrique Gurjão, dentre outros.
É um escárnio para com a população vermos os nomes de pais de governadores, tia de pastor, mães de governadores, concunhadas, tio-avó, ex-namorado da filha do padrinho do filho do governador e por ai vai , encimando nossas escolas , monumentos e espaços públicos .
Bem caminhou, tempos atras, o então prefeito Edmilson Rodrigues, que "cassou" o nome do Kennedy, meu quase xará, e que, tenho quase a certeza, jamais soube da existência do Pará ou Belém na geografia brasileira. Não é melhor irmos à Praça Waldemar Henrique do que ir à Praça Kennedy?
Quem nos proporcionou - e ainda proporciona - maior prazer? Claro que as deliciosas músicas do nosso maestro, este sim digno de uma homenagem.
Prefiro o som de Uirapuru do que o som dos mísseis e canhões americanos.

Kenneth Fleming

Yúdice Andrade disse...

Das 16h36, podes ter certeza que ela será "Feira da 25" para sempre. E não há de se estranhar isso. Não é apenas preguiça mental ou aversão a mudanças: é um evidente sintoma de como o batismo de logradouros públicos, em Belém, não segue nenhum padrão que seja assimilado pelo povo, pela sociedade, como pertencendo de verdade ao nosso mundo, à nossa história e cultura.

Kenneth, os teus comentários são precisos como uma incisão de bisturi nas mãos de um excelente cirurgião. Já ouvira falar desse livro, mas agora vou atrás dele. Sempre que posso, compro obras sobre Belém. Recentemente, por sinal, comprei "A cidade sebastiana", de Fábio Fonseca de Castro, mas ainda não pude ler.
Renovados agradecimentos.

Anônimo disse...

Caro Yúdice

O livro é, ou foi, editado pela CEJUP, 2ª edição de 1992. Novo acho que não tem mais. A 1ª edição é de 1970. Não é um livro dificil de ser fotocopiado, mas preciso verificar se já é possível, haja vista os direitos autorais.
Por oportuno, se você e os demais participantes do blog ainda não conhecem, recomendo o site : www. estantevirtual.com.br . Dele, participam mais de 1.800 sebos do Brasil, e é possível comparar preços, comprar os livros eletronicamente e recebê-los comodamente em casa.

Nele, vi que que o "Ruas de Belém" tem preços de R$ 101,00 a R$ 200,00, bastante salgado, mas que ressaltam a importância da obra.

Outro excelente livro que acho que deveria ser lido - em nossas escolas inclusive - é do Haroldo Maranhão - "Pará, Capital : Belém - Memórias & Pessoas & Coisas e Loisas da Cidade". É um excelente livro e traz informações muito interessantes, dentre elas sobre os estudos de Julio Cesar sobre a navegabilidade aérea, sobre Belém já ter abrigado obras de Ticiano e Rubens, como eram os arraiais do Círio nos idos de 1.830 e por ai vai.

Bom final de semana

Kenneth