A primeira vez que tratei do assunto aqui no blog foi em 23.3.2007: como um depoimento em juízo pode representar danos a uma criança já vitimizada por um crime sexual. Agora, com enorme satisfação, tomo conhecimento de que o Conselho Nacional de Justiça aprovou, ontem, por unanimidade, uma recomendação a todos os tribunais brasileiros para que implantem sistemas de tomada de depoimentos de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de crimes, que os preservem de maiores prejuízos emocionais. Pela generalidade do texto, entendo que a medida se aplica a qualquer delito, não apenas os sexuais, o que é ainda mais positivo.
Consoante notícia que pode ser encontrada na página do próprio CNJ, os depoimentos devem ser tomados por profissionais especializados, em recintos próprios, seguros e acolhedores, apartados das salas de audiências. Devem ser utilizados recursos tecnológicos (gravação de áudio e vídeo), que tornam o ato mais eficiente e menos agressivo, além da técnica de entrevista cognitiva. A infraestrutura deve permitir a prestação de assistência à saúde física e emocional à criança ou adolescente, em sendo necessário.
De parabéns, mais uma vez, o CNJ. Só me preocupa que a medida seja uma "recomendação". Convenhamos, quem recomenda não manda. E implementar uma iniciativa dessas exige compromisso com a humanidade, respeito e solidariedade pelo semelhante, que às vezes são muito mais difíceis de conseguir do que dinheiro.
PS — Clicando aqui, você pode aprender um pouco sobre o que é entrevista cognitiva.
5 comentários:
Parabéns CNJ, com certeza uma medida como essa vai auxiliar o judiciário no julgamento de feitos chegando mais perto de um ideal de justiça!
Eu já assisiti a um filme, baseado em fatos reais, onde a própria psicóloga fez um garoto de 12 anos confessar que tinha matado a amiga da irmã dele. A certeza dos pais na inocência do garoto fez com que a polícia continuasse investigando e acharam o verdadeiro culpado, não sem antes trazer sérios danos à familia inteira. Imagino uma criança, que já sofreu abuso, ainda ser "interrogada" por um profissional despreparado...
Vamos torcer por isso, Carlos.
Depois me informa o título do filme, Ana.
Professor esse assunto muito me interessa. Participei de um seminário sobre depoimento sem dano e constatei que ainda existe muita controvérsia em torno do assunto.
Como trabalho em uma entidade que disponibiliza atendimento interdisciplinar à vítima de violência, estou sempre atenta à opinião dos psicólogos e assistentes sociais sobre o assunto.
O projeto do depoimento sem dano prevê que o psicólogo entrevistador/facilitador deverá ter um ponto eletrônico no ouvido, para ser direcionado por um Juiz a respeito das perguntas que devem ser feitas à criança. Isso gerou uma revolta entre os psicólogos que alegam perder a autonomia durante o procedimento se ele for realizado dessa maneira.
Li rapidamente sobre entrevista cognitiva e não sei se existe semelhança quanto a esse tipo de procedimento, só posso dizer que para minimizar os danos da criança, a prática do depoimento deve ser pensada em uma esfera interdisciplinar, como já está sendo feito. Porém é preciso existir um entendimento entre as classes profissionais para que isso ocorra o mais breve possível, percebi a existência de egos muito inflados, todos querem o mérito do projeto e acabam não entrando em acordo nenhum. Quem perde é a criança.
Sem dúvida, Maíra. Como Psicóloga, Bacharel em Direito e servidora do Judiciário (tendo atuado em Varas de Família, Criminais e atualmente atuando em uma Vara de Infância), o depoimento de crianças não apenas me interessa como perpassa minha prática diária, motivo pelo qual participei de diversos Seminários e cursos sobre o Depoimento sem Dano, bem como escrevi minha monografia de conclusão de curso sobre esse assunto.
Infelizmente, o que constatamos é exatamente o que vc colocou: a guerra de egos (e o corporativismo)
entre as classes profissionais envolvidas infelizmente ainda estão sendo colocados acima do melhor interesse da criança.
É verdade que o projeto prevê que o Técnico (Psicólogo ou Assistente Social) que deverá ouvir a criança deve ter
um ponto eletrônico no ouvido para entender o que o juiz precisa saber da criança. E aí está a maior recusa dos Psicólogos e Assistentes Sociais em apoiar essa prática, pois alegam que sua autonomia será ferida.
O que quase ninguém, porém, sabe é que o projeto também prevê que o técnico tem total autonomia para fazer ou não a pergunta direcionada pelo juiz à criança. É ele, técnico especializado, quem decide, em ultima análise,
se a criança está pronta ou não para ser indagada acerca de determinados assuntos.
De minha parte, estou convencida de que a grande maioria das pessoas que são contrárias ao projeto o são porque não conhecem de perto a realidade do judiciário e de como nossas crianças têm sido ouvidas ou porque - infelizmente - muitos nem chegaram a ler o projeto, e tiram conclusões precipitadas e fracionadas acerca do mesmo.
É espantosa a quantidade de colegas que se posicionam (principalmente contrárias) com relação ao projeto, e quando simplesmente pergunto se já leram o mesmo, respondem que não (posso dizer que aproximadamente 99%!)!!! Posicionam-se dessa forma porque leram ou ouviram coisas muitas vezes absolutamente superficiais e sem importância sobre o assunto.
Sou totalmente favorável à implantação do mesmo
em todos os tribunais do Brasil, bem como a que as pessoas em geral possam, antes de formar opiniões PRÉ-
conceituosas, estudar com calma e conhecer o projeto em todos os seus detalhes, e não de forma fracionada.
Em minha opinião, ponto para o CNJ!!
Aline Bentes.
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