Mas eis que, iniciada a instrução criminal, o promotor de justiça, sequioso de provar a acusação contra o réu, pediu que a vítima fosse chamada para prestar depoimento. Isso mesmo, a vítima, de 3 anos! E como desgraça nunca vem sozinha, o juiz deferiu o pedido!
Imaginem a cena: um garoto dessa idade, na presença de estranhos (o juiz, o promotor, o secretário de audiência, o defensor do réu — este, único que pode estar ausente — e quiçá algum estagiário), tendo que contar como seu pai abusava sexualmente dele. E o inteligentíssimo juiz convocou a psicóloga do fórum, para que ela participasse da audiência e fizesse o menino falar. Como se fosse só chegar e dizer "aí, amiguinho, conte para a titia o que o seu papai fazia com você!"
A psicóloga obedeceu, claro, porque tinha que obedecer. Mas ficou indignada, já que tem sangue nas veias. E quando alguém com acesso à informação me contou a história, meu sangue igualmente ferveu, ante a absoluta incapacidade de dois agentes públicos, incumbidos de proteger a sociedade, de perceber o óbvio: que eles lidam com seres humanos, não com leis, processos e papeis.
A atitude da dobradinha promotor-juiz é revoltante porque revela absoluto despreparo para compreender a gravidade do ato e suas implicações. Tem-se aqui, pelas mãos de quem deveria proteger a criança, a prática do que chamamos de vitimização secundária.
Chama-se primária a vitimização quando a pessoa sofre o crime propriamente dito. Secundária, quando passa a amargar consequências outras do delito, decorrentes das reações da sociedade (p. ex., preconceito, estigmatização) ou da imprensa (exploração irresponsável do drama pessoal), ou ainda do mau aparelhamento do Estado para lidar com a situação (p. ex., constrangimentos quando procura a polícia, o vexame de ser submetido a uma perícia sexológica, a assunção do ônus de forçar as autoridades a punir o agressor, etc.), sem falar nos riscos de retaliação do próprio criminoso. Naturalmente, são efeitos que não precisavam existir e que servem apenas para aumentar o sofrimento, a humilhação, a vergonha e a revolta da vítima.
Como se não bastasse sofrer um dos mais terríveis tipos de violência, no comecinho da vida, quando os traumas mal podem ser verbalizados e tendem a se esconder no subconsciente, gerando graves dificuldades na vida adulta; como se não bastasse ver ruir a própria família, essa criança ainda precisa estar à disposição de uma curiosidade insana, de um tecnicismo processual pervertido, de uma falta de bom senso imperdoável. Não basta um laudo dos psicólogos? Será que eles são tão inconfiáveis que os lobos precisam beber a verdade direto da boca do ofendido?
Membros da magistratura e do Ministério Público frequentemente caem no despautério de se considerar sobre-humanos. E, com isso, tendem a perder a noção de uma realidade: que precisam estudar, aprimorar-se, não apenas na frialdade das leis, mas acima de tudo no humanismo, o mais importante conhecimento que deveria ter um jurista, mas sistematicamente ignorado e até mesmo negado.
Desculpem, mas fiquei revoltado com esse caso.
Art. 227 da Constituição Federal: "É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-lo a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão."
7 comentários:
Sr. Esta condição de sobrehumanos ou semi-deuses, parece que incorporou-se nas nossas autoridades. É o alter-ego dos mesmos!!!
Para corroborar o que digo, veja o vergonhoso,-porque nem legal é, já que pulou etapas do processo legislativo, sendo aprovado à unanimidade, mesmo não estando concluido o projeto!!!-aumento de verba de gabinete dos senhores deputados. Aumento de 50%!!!.
Sr. Quem estava no plenário observou, que a referida votação nem constava na pauta do dia, o que convenhamos é por si só um ato de escárnio às normas do Regimento Interno da Alepa. Para completar sr. NAÕ HOUVE NEM DISCUSSÃO DO ASSUNTO EM TELA, sendo aprovado IMEDIATAMENTE.
Esta é em suma a materialização do moral dos nossos parlamentares, a lei para eles é apenas palavra morta, e numa Casa onde o exemplo às mesmas deveria ser o patamar de qualquer representação popular. Infelizmente não é isso que se observa na Alepa, e diga-se: exemplos disseminados pelo9s parlamentares e não pelos servidores.
Senhor, cumpra com sua obrigação: denuncie o juiz e o promotor ao Tribunal e ao MP.
Anônimo das 10h45, percebi que você é servidor da ALEPA, o que deve explicar suficientemente a sua indignação. Aliás, como cidadãos, todos devemos nos indignar.
Anônimo das 14h01, a questão não é tão simples assim. Afinal, o processo corre em segredo de justiça e devemos ter cuidado para não expor, ainda mais, a vítima. Eu mesmo sequer sei qual a vara em que o processo tramita, por isso não sei quem são o juiz e o promotor do caso.
Demais disso, tecnicamente (a maldição é essa) a decisão não está errada. Ela o é sob uma lógica não apenas moral, mas também pelo bom senso. Porém, sem uma violação clara à lei (eu acho que houve violação à Constituição, mas isso é discutível sob uma abordagem legalista), o juiz e o promotor podem posar de santos e eu, de detrator.
É preciso ponderar melhor o que fazer. A meu ver, como o mal já está feito, o importante é garantir que não se repita. Nesse e em nenhum outro processo.
"segredo de justiça", e a criança continua sendo violentada. Segredo na violência desse "cara" em casa. Segredo no templo da mãe, que segura a balança com vendas nos olhos. Será que a mãe biológica dessa criança, também está com os olhos e boca fechados. Se fosse meu filho, eu teria agora um número na minha fotografia.
Estou revoltada.
Será que a criança vai mostrar ainda, a posição em que ficava, no momento do ato da violência? Imagine a cena.
Você acredita que a mãe não sabia de nada? Nunca percebeu nada? Não dava banho nessa criança? A mãe não percebeu nada, na relação do pai com o filho? Na verdade esse "monstro" e não pai.
Cadeira elétrica seria pouco para esse crápula".
Mulheres-mães, compreendo a revolta. Não há como não sentir. Concordo. É por isso que devemos cuidar de nossas crianças, não? Nem sempre podemos evitar que o mal sobrevenha. Mas naquilo em que possamos, que o façamos e bem.
Tal atitude tomada foi irresponsável, e que causou ainda mais danos à criança já tendo que conviver com uma situação tão danosa como essa, e, por mais que, tal criança ao crescer, nem lembre do ocorrido, mas seu inconsciente já registrou todas essas violencias sofridas! De certo é extremamente incompetente essa atitude do promotor-juiz, um triste exemplo de como não fazer o Direito.
Ass: Mônica Queiroz
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