segunda-feira, 19 de março de 2007

Dramaturgia

Demos um tempo nos assuntos conflituosos de que temos tratado.

É extremamente comum encontrar pessoas que afirmam não gostar de novelas. Quando afirmam isso, fazem cara de desprezo ou um certo ar de superioridade. Suscitam argumentos-clichê sobre serem repetitivas, banais, repletas de lugares-comuns, imbecilizantes e inversoras de valores. Há um pouco disso tudo, certamente. Não há como acolher em parte tais argumentos, se basta ver um segundo de Pé na jaca para duzentos neurônios se suicidarem.
Eu poderia listar incontáveis títulos da mais rematada porcaria. Porém, também sou capaz de fazer uma lista, menor sem dúvida, porém longa, de glórias da teledramaturgia. Não precisaria citar os ícones, como Malu Mulher, Roque Santeiro ou Selva de Pedra. Qualquer intelectual-de-orelha-de-livro sabe fazer citações óbvias. Poderia citar o romantismo desbragado de uma Direito de amar das seis (1987), o humor meio nonsense de uma Vereda Tropical das sete (1984/1985) e as tramas maduras e de responsabilidade social de uma Corpo a corpo (1984/1985).
Engana-se quem deduziu daí que minha opinião é que apenas as novelas antigas eram boas. Em tempos mais recentes também tivemos obras de valor, tais como O cravo e a rosa às seis (2000), Da cor do pecado às sete (2005) e Senhora do destino às oito (2004/2005). Isso sem falar nas séries, que costumam ser bem mais elaboradas, merecendo menção Hilda Furacão (1998), a injustiçada pela audiência Os maias (2001) e Cidade dos homens (2002). E olha que não assisti à maior parte do que citei, títulos que escolhi com base no sucesso que tiveram junto ao público, à crítica ou ambos.
Eu gosto de novelas. E lamento pelas pessoas que precisam não gostar (ou ao menos declarar que não gostam) para parecer mais inteligentes ou sofisticadas.
O mundo inteiro adora dramaturgia. Se o teatro é menosprezado pelo povo, infelizmente, as obras audiovisuais são um sucesso absoluto em toda parte. Bastaria citar o cinema para provar o alegado. Mas o cinema fica de fora, por hoje, eis que os filmes consomem em média duas horas ou pouco mais. Ocupo-me neste momento apenas da teledramaturgia, que ocupa meses ou anos da vida de um ser humano. É um fenômeno.
Eu citaria dois modelos:
1. o brasileiro, de novelas, histórias contínuas que duram de seis a oito meses, com capítulos diários, tramas mais populares e grande influência da opinião pública no desenvolvimento da história;
2. o norteamericano, de seriados, histórias contínuas (como Lost) ou descontínuas, ligadas por um fio condutor (como Arquivo X), exibidas em temporadas com no máximo 24 episódios anuais, forçando o espectador a esperar outros tantos meses para saber o rumo dos acontecimentos.
Qualquer um dos modelos é vendido para o resto do mundo, com absoluto sucesso, gerando uma cultura de celebridades e glamour. E também manifestações verdadeiramente artísticas, como no Brasil se podem citar O auto da Compadecida (1999) e Hoje é dia de Maria (2005).
Será que podemos dizer, sem cairmos nas generalizações ridículas, que esse sucesso todo deriva apenas do mau gosto do cidadão comum, especialmente no Brasil e nos Estados Unidos? Somos uma humanidade constituída de néscios, ignorantes convictos, sem classe e perspectiva? Duvido.
Gostamos de dramaturgia porque é delicioso acompanhar histórias dia a dia, ou semana a semana. Porque precisamos nos importar com as vidas fictícias, para dar um tempo nas nossas. E porque é uma das opções de lazer mais divertidas e seguras que existem.
Infelizmente, há mais de uma década que não acompanho mais os rumos da teledramaturgia brasileira — e estritamente por motivos de trabalho. Não fosse pela incompatibilidade de horários, eu estaria lá, de cara para a TV, adorando.
Eu vejo todos os telejornais que posso. Mas nem só de telejornal vive o homem. Tem que haver um sabor e uma descontração também.

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