terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Parto normal é coisa de pobre

Esta eu conto porque devidamente autorizado pelo protagonista.
Meu amigo cujo primogênito nasceu na quinta-feira passada registrou o bebê ontem. A experiência rendeu.
Para quem não sabe, você registra a criança apresentando um documento regulamentado pelo Ministério da Saúde, a Declaração de Nascido Vivo DNV. Esse documento contém uma série de informações sobre a mãe, dentre as quais estado civil e profissão. Na DNV do filho de meu amigo, a mãe aparecia como solteira e do lar. O rapaz reclamou do erro, sendo que a funcionária da maternidade (por sinal, uma das mais renomadas da cidade a maternidade, não a funcionária) disse que não poderia corrigir. O pai insistiu que não poderia apresentar ao cartório um documento com informações inverídicas, já que sua esposa era casada e advogada. Aí ele escutou a grande explicação: a funcionária disse que toda mulher que faz parto normal é "solteira" e "do lar".
Com essa alucinante assertiva, tentou minimizar o problema. No final, o documento foi retificado, mas o episódio nos rendeu uma advertência importante: hoje em dia, parto normal é coisa de pobre. O preconceito se enraizou de uma tal forma no imaginário coletivo que, daqui a pouco, nem mais teremos noção da realidade. E observe que falo de uma pessoa que trabalha com isso.

5 comentários:

Luiza Montenegro Duarte disse...

Absolutamente chocante. A mentalidade do brasileiro é uma coisa impressionante.
Como mulher, que conversa mais abertamente sobre isso com outras mulheres, devo lhe dizer a razão principal para isso: o medo de ficar "larga" (assim, nesses termos mesmo).
Não interessa que pesquisas e médicos digam que a mulher não fica menos atrativa sexualmente. A coisa está tão enraizada no imaginário das pessoas que elas não acreditam e lançam mão de histórias de conhecidos. Ou conhecidos de conhecidos.
Também já tentei apelar para a comparação, dizendo que nos Estados Unidos e na Europa a predominância absoluta é o parto normal. Surpreendentemente, o mesmo povo que admira tudo o que é feito lá fora, não embarca nessa também.
Para acabar com o dilema, bastava ir ao dicionário e verificar o significado da palavra normal. Mas querem complicar...

Yúdice Andrade disse...

Já ouvi falar disso, Luiza, mas sempre me concentrei na ideia de medo da dor. Vou dar destaque ao teu comentário e ver se alguém se anima a discutir mais.

Loyda Macedo disse...

Que absurdo... faço parte de um grupo que apoia ao parto humanizado e garanto que tem muitas mulheres instruídas.
Esse tipo e história me revolta justamente pela banalidade da cesariana que é uma cirurgia de risco, mas fazer o que se a mulher não está disposta a conhecer o que é melhor para ela e para seu bebê...
esse negócio de "larga" é pura ignorância, a mulher desconhece seu próprio corpo e permite que médicos lhe roubem de seu parto... lamentável...

Yúdice Andrade disse...

É um absurdo, sem dúvida, mas disseminado a tal ponto na sociedade que me levou a escrever mais de uma vez a respeito. Já sabíamos da preferência irresponsável pelo parto cesariano, mas durante a gestação de minha esposa ficamos impressionados com o nível da coisa. Principalmente por partir de gente altamente instruída e com acesso a todo tipo de comodidade material. Triste.

Anônimo disse...

Acho que a mulher tem o direito de escolher. Eu, nunca escolheria parto normal, conheço meu limite, medos.
Erm relação ao "ficar larga", é um rico real, pouco falado, é tabu. Arriscar ou não, isso é um direito de toda mulher.