terça-feira, 14 de julho de 2009

Progressão virtual: caso concreto

Preso provisório consegue progressão virtual
Por Lilian Matsuura


Contemplado com a progressão virtual, Francisco João da Silva, preso provisoriamente há 11 meses por acusação de porte ilegal de arma, foi posto em liberdade mesmo antes de ser julgado e de qualquer condenação. A inovação partiu do juiz Bruno Azevedo, da 1ª Vara da Comarca de Guarabira (PB). Ele explica o benefício: “se condenado fosse, havendo a detração do período de encarceramento provisório, já teria tempo mais do que suficiente para pleitear a progressão de sua pena”. A pena para o crime é de dois a quatro anos de prisão.
A lógica usada pelo juiz ao dar liberdade ao acusado sem sentença é a mesma da chamada prescrição virtual, ou em perspectiva, em que, antes de condenar, o juiz reconhece a prescrição levando em conta a possível pena que seria fixada na sentença condenatória.
No Supremo Tribunal Federal, a prescrição virtual não é aceita. Em diversos casos, os ministros concluíram que não há previsão legal para a aplicação do instituto. O ministro Sydney Sanches, conforme registro na Revista Trimestral de Jurisprudência 135/590, indeferiu o pedido de prescrição virtual no julgamento do RHC 669-13. “Antes da sentença, a pena é abstratamente cominada e o prazo prescricional se calcula pelo máximo, não podendo ser concretizada por simples presunção”, escreveu em seu voto.
No Superior Tribunal de Justiça, a tese também costuma cair. “Somente ocorre a prescrição regulada pela pena em concreto após o trânsito em julgado para a acusação, não havendo falar, por conseguinte, em prescrição em perspectiva, desconsiderada pela lei e repudiada pela jurisprudência”, concluiu o ministro Hamilton Carvalhido, ao julgado o RHC 11.249.
O Ministério Público, entretanto, costuma dar parecer favorável a aplicação da prescrição virtual, como no caso analisado pelo juiz Bruno Azevedo, da Comarca de Guarabira.
Na sentença (clique
aqui para ler), o juiz afirma que o Estado não pode fazer com que o preso suporte as mazelas do sistema penitenciário brasileiro e, ao mesmo tempo, deixar de garantir os benefícios a quem tem direito. “Quem suporta o mal se credencia para o bem. E em um Estado Democrático de Direito, o mal será sempre a violação a preceitos fundamentais. A não observância das regras constitucionais postas”, conclui.
Para garantir a aplicação da Constituição Federal, diz, decidiu fazer valer as normas constitucionais em detrimento da letra fria da lei. A afronta à Carta Maior, por parte do Estado, se dá, segundo Bruno Azevedo, quando o preso provisório fica indefinidamente detido sem sentença condenatória e, muito menos, absolvição. Segundo o juiz, esta é uma forma de antecipação da pena, inadmissível.
“Se a prisão provisória perdura, o problema se agrava, pois além da ocupação indevida, gerando o problema da falta de vagas no sistema, há o desrespeito a direitos fundamentais do cidadão preso provisoriamente”, alerta o juiz.


Fonte: Consultor Jurídico

Volta e meia, magistrados de primeiro grau adotam posicionamentos inovadores, abraçando teorias modernas e libertárias, muitas vezes sem angariar a simpatia dos tribunais a que estão vinculados, ou mesmo dos tribunais superiores (como exemplifica a prescrição virtual). Confesso que fiquei curioso para saber o desdobramento deste caso que, quanto aos fundamentos, parece-me correto.
Vamos a ver.

2 comentários:

Reginaldo Ramos disse...

Caro Yúdice,
Primeiro, quero dizer que pretendo conhecê-lo. E eu sou macho, e muito macho, tá estranhando!!!!
Pô, antes me apaixonei pelo Lauande, foi-se. Depois pelo Juvêncio, que me deixou viúvo, sem mais nem menos.
Não vou perder o terceiro, sem uma cachaça gelada, num buteco da vida.
Sim, agora ao tema.
Concordo inteiramente com a decisão do juiz.
Esperar a sentença, com o estado-juiz que temos, é punir o "constitucionado". Ineficiência só deve prejudicar o estado, nunca o cidadão. Ou se perde o status de cidadão ao ser indiciado?!
Negócio interessante a ser discutido, também, a questão da suspensão do processo para o réu não encontrado. Me parece que a última reforma processual penal piorou:A suspensão é para sempre.
Antes, suspendia-se durante o prazo máximo da pena abstrada, a partir de quando voltava a correr o prazo prescricional.
Agora o bandido inteligente fica ad eterno nas mão do estado. Vê se pode!!
Penso que o ideal é que o prazo de prescrição flua livremente, compareça ou não o réu.
O estado deve se virar! Tem a obrigação de ser competente! Investigar com inteligência, usar novas tecnologias, preparar policiais, julgar com rapidez, sem abrir mão das garantias constitucionais, etc, etc.
É o que eu penso.

Yúdice Andrade disse...

Não estou te estranhando, não, Reginaldo. Tu é que fizeste a ressalva! ahahahahah
A sensação é essa, mesmo: vontade de conhecer as pessoas que, por enquanto, são apenas nomes na blogosfera.
Quanto ao cerne do comentário, destaco que o posicionamento predominante na doutrina é no sentido de que, ao contrário do que afirmas, a suspensão da prescrição, no caso de citação editalícia desatendida, não é perpétua, não: ela dura o mesmo tempo da própria prescrição. Um exemplo concreto:
Sabemos que o prazo prescricional começa a fluir com a consumação do delito, via de regra. Suponha um crime com prescrição em quatro anos. O réu é citado por edital e não aparece nem constitui defensor, ocorrendo a suspensão, do processo e da prescrição, na forma do art. 366 do CPP, seis meses após o crime. Segundo a doutrina, essa suspensão perdurará por quatro anos. Depois, automaticamente, independentemente de decisão judicial, a prescrição volta a correr e se opera após três anos e seis meses.
Não é o que diz a lei, mas uma construção doutrinária, que parte da análise da própria Constituição, a qual menciona expressamente quais são os delitos imprescritíveis. Muito sensato, aliás.