sexta-feira, 17 de julho de 2009

Che: o argentino

Foi com alguma surpresa que descobri que o filme Che: o argentino (Che: Part One, direção de Steven Soderbergh, 2008) ainda estava em cartaz na cidade naturalmente, no circuito alternativo, em exibição no Cine Líbero Luxardo. Ou pelo menos estava, até ontem. Corri para lá, antes que perdesse a oportunidade de ver a obra na tela grande.
À medida que o público entrava na sala de projeção (nunca vi o minúsculo cinema tão cheio: havia mais de 30 pessoas lá), dei-me conta de que não se tratava de um filme qualquer, e sim de um sobre Che Guevara. Não faltou o garoto com uma camiseta com a efígie do guerrilheiro estampada.
Como já disse em outras ocasiões, acho os críticos de cinema um saco, inclusive os de fundo de quintal, por isso de modo algum pretendo analisar a obra. Registro apenas a impressão de um expectador.
Basicamente, o filme mostra Che Guevara aos 30 anos, marchando com tropas minguadas em direção a Havana, para tomar o poder através da luta armada. Em uma edição não linear, vemos o passado (o encontro no qual ele e Fidel Castro se conhecem) e o futuro, quando Che, representante diplomático de Cuba, vai à ONU, em Nova York, pedir o reconhecimento de seu governo e o fim das sanções que o país sofria, impostas por vontade dos Estados Unidos.
Não é fácil retratar um mito ainda mais um que desperta tão furiosas e contraditórias paixões como Che. Por isso, a primeira pergunta deve ser: o que pretendia a equipe quando decidiu fazer o filme? Revisionismo histórico? Glorificação ou desmascaramento? Propaganda ideológica, seja lá de que ideologia for? Dar recado aos Estados Unidos? Ou simplesmente ganhar dinheiro com uma figurinha fácil de atrair público?
O filme começou a surgir quando o portorriquenho Benício del Toro se encantou com a vida do guerrilheiro, após escutar seu nome na canção "Indian girl", dos Rollings Stones, e estudar sobre ele, inclusive lendo as cartas que mandou a seus familiares durante sua estada em Cuba. Logo, a premissa é de simpatia pelo personagem, ainda mais porque, sendo latinoamericano, Del Toro deve ter suas afinidades com o sofrimento desses povos. A par disso, o roteiro de Peter Buchman foi baseado no livro escrito pelo próprio Ernesto Guevara de la Serna sobre a revolução cubana. Logo, compreensível que os personagens sejam mostrados como pessoas imbuídas do mais puro e inquestionável desejo de libertar o país da opressão, representada pela miséria, desemprego, concentração de terras e sustentação econômica do imperialismo estadunidense, tudo isso representado em Fulgêncio Batista, um presidente golpista e ilegítimo. Temos, portanto, um retrato romântico dos guerrilheiros, como pessoas generosas e abnegadas, movidas por um incontrolável desejo de justiça social, capazes de morrer por isso. Destaque-se a resposta dada por Che à jornalista americana que o questiona sobre os atributos que caracterizam um guerrilheiro: o amor. O "verdadeiro guerrilheiro" se caracteriza por "sentimentos de amor": à pátria, à justiça e à verdade.
Enfim, quem já adora Che Guevara encontra no filme maiores motivos para isso. Quem procura um, encontra. E os antipáticos a ele decerto sairão muito irritados, se é que se darão ao trabalho de ir conferir, o que duvido. Pessoas que, em pleno século XXI, ainda fazem discursos enérgicos e raivosos contra os comunistas não são lá muito inteligentes ou, no mínimo, estão profundamente desinformadas.
Na imagem, da direita para a esquerda, vemos Del Toro como Che, Rodrigo Santoro como Raúl Castro (irmão de Fidel e atual presidente cubano) e Demián Bichir como Fidel Castro. Aliás, o líder maior da revolução também é retratado da mesma forma idealizada, o que deve ser pouco palatável a muitos, que se acostumaram a ver nele um dos últimos ditadores ainda de pé no mundo, mesmo que cambaleante. Em seu discurso na ONU, Che fustiga as ditaduras e, segundo consta, o país insular que ajudou a mudar se tornou uma, a mais longeva de todas.
Apesar de lento a maior parte do tempo, o filme me agradou bastante, já que adoro História e, como estudante brasileiro que fui, estudei sobre a Roma antiga, sobre a Grécia, sobre várias épocas da Europa, mas quase nada sobre a América Latina. Foi uma forma de aprender um pouco mais, agora que já tenho senso crítico o suficiente, suponho, para questionar certas afirmações e ideologias inclusive o sonho de Che, de "libertar" todo o continente latinoamericano, o que acabou lhe custando a vida, na Bolívia.
Aguardo a parte 2.

3 comentários:

Carlos Barretto  disse...

A parte 2, vi em Cuba, no Cine Yara.
Adianto-lhe que é modorrenta, tediosa, quase um Rohypnol.
E derruba de vez o sonho de Che, pois mostra-o derrotado na Bolívia.
Mas veja.

Abs

Yúdice Andrade disse...

Se já achei a parte 1 lenta, a 2 promete me cansar, pelo visto. Mas preciso concluir o que comecei. E quanto à derrota e morte humilhante de Che na Bolívia, paciência, é história. Precisamos estar cientes disso.
Além do mais, aprecio e respeito a figura de Che, mas não sou nenhum entusiasta, desses que vemos aos montes por aí. Logo, a sua derrocada decerto não me afetará.
Como são os cinemas cubanos?

Carlos Barretto  disse...

O Cine Yara, é amplo, um balcão, poltronas confortáveis e muito, mas muito baratos. São muito frequentados. Já o cinema cubano, digo a arte, existem alguns filmes verdadeiramente imperdíveis, produzidos com a ajuda do ICALC. Entre eles, já recomendei em algum lugar o "Morangos e Chocolate". Feito por uma dupla de diretores muito interessantes. Parte dele, é rodado em frente a sorveteria Copellia, que fica por sua vez, bem em frente ao Cine Yara. Vc pode locá-lo com facilidade na Fox Video.
Existem outras salas localizadas em Habana Vieja, igualmente majestosas. Mas o Yara, é de arquitetura mais recente.

Abs