Foi com alguma surpresa que descobri que o filme Che: o argentino (Che: Part One, direção de Steven Soderbergh, 2008) ainda estava em cartaz na cidade — naturalmente, no circuito alternativo, em exibição no Cine Líbero Luxardo. Ou pelo menos estava, até ontem. Corri para lá, antes que perdesse a oportunidade de ver a obra na tela grande.
À medida que o público entrava na sala de projeção (nunca vi o minúsculo cinema tão cheio: havia mais de 30 pessoas lá), dei-me conta de que não se tratava de um filme qualquer, e sim de um sobre Che Guevara. Não faltou o garoto com uma camiseta com a efígie do guerrilheiro estampada.
Como já disse em outras ocasiões, acho os críticos de cinema um saco, inclusive os de fundo de quintal, por isso de modo algum pretendo analisar a obra. Registro apenas a impressão de um expectador.
Como já disse em outras ocasiões, acho os críticos de cinema um saco, inclusive os de fundo de quintal, por isso de modo algum pretendo analisar a obra. Registro apenas a impressão de um expectador.
Basicamente, o filme mostra Che Guevara aos 30 anos, marchando com tropas minguadas em direção a Havana, para tomar o poder através da luta armada. Em uma edição não linear, vemos o passado (o encontro no qual ele e Fidel Castro se conhecem) e o futuro, quando Che, representante diplomático de Cuba, vai à ONU, em Nova York, pedir o reconhecimento de seu governo e o fim das sanções que o país sofria, impostas por vontade dos Estados Unidos.
Não é fácil retratar um mito — ainda mais um que desperta tão furiosas e contraditórias paixões como Che. Por isso, a primeira pergunta deve ser: o que pretendia a equipe quando decidiu fazer o filme? Revisionismo histórico? Glorificação ou desmascaramento? Propaganda ideológica, seja lá de que ideologia for? Dar recado aos Estados Unidos? Ou simplesmente ganhar dinheiro com uma figurinha fácil de atrair público?
O filme começou a surgir quando o portorriquenho Benício del Toro se encantou com a vida do guerrilheiro, após escutar seu nome na canção "Indian girl", dos Rollings Stones, e estudar sobre ele, inclusive lendo as cartas que mandou a seus familiares durante sua estada em Cuba. Logo, a premissa é de simpatia pelo personagem, ainda mais porque, sendo latinoamericano, Del Toro deve ter suas afinidades com o sofrimento desses povos. A par disso, o roteiro de Peter Buchman foi baseado no livro escrito pelo próprio Ernesto Guevara de la Serna sobre a revolução cubana. Logo, compreensível que os personagens sejam mostrados como pessoas imbuídas do mais puro e inquestionável desejo de libertar o país da opressão, representada pela miséria, desemprego, concentração de terras e sustentação econômica do imperialismo estadunidense, tudo isso representado em Fulgêncio Batista, um presidente golpista e ilegítimo. Temos, portanto, um retrato romântico dos guerrilheiros, como pessoas generosas e abnegadas, movidas por um incontrolável desejo de justiça social, capazes de morrer por isso. Destaque-se a resposta dada por Che à jornalista americana que o questiona sobre os atributos que caracterizam um guerrilheiro: o amor. O "verdadeiro guerrilheiro" se caracteriza por "sentimentos de amor": à pátria, à justiça e à verdade.
Enfim, quem já adora Che Guevara encontra no filme maiores motivos para isso. Quem procura um, encontra. E os antipáticos a ele decerto sairão muito irritados, se é que se darão ao trabalho de ir conferir, o que duvido. Pessoas que, em pleno século XXI, ainda fazem discursos enérgicos e raivosos contra os comunistas não são lá muito inteligentes ou, no mínimo, estão profundamente desinformadas.
Na imagem, da direita para a esquerda, vemos Del Toro como Che, Rodrigo Santoro como Raúl Castro (irmão de Fidel e atual presidente cubano) e Demián Bichir como Fidel Castro. Aliás, o líder maior da revolução também é retratado da mesma forma idealizada, o que deve ser pouco palatável a muitos, que se acostumaram a ver nele um dos últimos ditadores ainda de pé no mundo, mesmo que cambaleante. Em seu discurso na ONU, Che fustiga as ditaduras e, segundo consta, o país insular que ajudou a mudar se tornou uma, a mais longeva de todas.
Apesar de lento a maior parte do tempo, o filme me agradou bastante, já que adoro História e, como estudante brasileiro que fui, estudei sobre a Roma antiga, sobre a Grécia, sobre várias épocas da Europa, mas quase nada sobre a América Latina. Foi uma forma de aprender um pouco mais, agora que já tenho senso crítico o suficiente, suponho, para questionar certas afirmações e ideologias — inclusive o sonho de Che, de "libertar" todo o continente latinoamericano, o que acabou lhe custando a vida, na Bolívia.
Aguardo a parte 2.
3 comentários:
A parte 2, vi em Cuba, no Cine Yara.
Adianto-lhe que é modorrenta, tediosa, quase um Rohypnol.
E derruba de vez o sonho de Che, pois mostra-o derrotado na Bolívia.
Mas veja.
Abs
Se já achei a parte 1 lenta, a 2 promete me cansar, pelo visto. Mas preciso concluir o que comecei. E quanto à derrota e morte humilhante de Che na Bolívia, paciência, é história. Precisamos estar cientes disso.
Além do mais, aprecio e respeito a figura de Che, mas não sou nenhum entusiasta, desses que vemos aos montes por aí. Logo, a sua derrocada decerto não me afetará.
Como são os cinemas cubanos?
O Cine Yara, é amplo, um balcão, poltronas confortáveis e muito, mas muito baratos. São muito frequentados. Já o cinema cubano, digo a arte, existem alguns filmes verdadeiramente imperdíveis, produzidos com a ajuda do ICALC. Entre eles, já recomendei em algum lugar o "Morangos e Chocolate". Feito por uma dupla de diretores muito interessantes. Parte dele, é rodado em frente a sorveteria Copellia, que fica por sua vez, bem em frente ao Cine Yara. Vc pode locá-lo com facilidade na Fox Video.
Existem outras salas localizadas em Habana Vieja, igualmente majestosas. Mas o Yara, é de arquitetura mais recente.
Abs
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