Durante décadas, convivemos com dois tipos penais caracterizados como crimes sexuais fraudulentos. A ideia era que não apenas através da violência, mas também do engano, uma pessoa poderia ser submetida a uma prática sexual indesejada. Como ideia geral, muito correto. O problema é que boa parte dessas condutas podia até fazer algum sentido no passado, quando mesmo entre pessoas casadas a sexualidade era tabu. Num mundo em que marido e mulher se relacionavam através de um furo no lençol, no escuro, e jamais se viam despidos, era até razoável que uma mulher recebesse um estranho supondo tratar-se do esposo. Fora dessas hipóteses extremas, não.
Os exemplos dados pelos autores de manuais de Direito Penal são hilários. Os mais modernos, talvez cônscios do ridículo, preferem citar exemplos dos clássicos. E dá-lhe Magalhães Noronha e Heleno Fragoso! Por isso, tenho dito em minhas aulas que a posse sexual mediante fraude é uma hipótese a ser desconsiderada da vida real. Muito diversamente, o atentado ao pudor mediante fraude não apenas é plausível como ocorre de fato, podendo-se citar como exemplo mais comum a hipótese de um médico, a pretexto de examinar o paciente, praticar atos libidinosos com ele, tais como toques lascivos.
Os dois tipos penais em apreço também ficaram famosos por terem, dentre as suas elementares, a menção a "mulher honesta" como vítima, o que foi objeto de acirrados e inúteis debates ao longo dos anos, até que a Lei n. 11.106, de 2005, teve a felicidade de acabar com a alusão discriminatória e indemonstrável.
O PLS 253, na mesma linha de unificar os delitos, acaba com o atentado ao pudor mediante fraude e transforma a posse sexual em violação sexual mediante fraude, uma terminologia mais apropriada, já que "posse" é um poder que se exerce sobre coisas e não sobre pessoas. A pena é duplicada. Eia a redação:
Art. 215. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos.
Parágrafo único. Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa.” (NR)
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