domingo, 20 de janeiro de 2008

A página infeliz não foi virada

TORTURA
Proposta tramita há 12 anos
Projeto permite punir militares

Por pressão das Forças Armadas, está parado há 12 anos no Congresso projeto que pode abrir brecha para punir os militares responsáveis por torturas e mortes durante a ditadura. O texto da Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas, da qual o Brasil é signatário, está pronto para ser votado no plenário da Câmara desde outubro de 1995, mas é sempre retirado da pauta. Se aprovado, o governo terá que se comprometer a não ser responsável pelo desaparecimento de pessoas, nem permitir ou tolerar que o fato ocorra, mesmo em estado de emergência, exceção ou suspensão de garantias individuais. Para militantes de direitos humanos, o texto pode significar uma “revogação” da Lei de Anistia, que impede julgamento de militares que atuaram naquele período. O projeto de decreto legislativo, enviado em 1994 pelo então ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, no governo Itamar Franco, prevê “punir os autores, cúmplices e encobridores do delito do desaparecimento forçado de pessoas”. “A resistência em se aprovar o texto da Convenção é uma demonstração de receio dos militares. Se aprovada, vai abrir uma nova etapa no país, com a possibilidade de se julgar aqueles militares que cometeram atrocidades no passado”, disse o advogado Augustino Veit, ex-presidente da Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos do Ministério da Justiça. No Congresso, o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), porta-voz dos militares na Câmara, está à frente da tentativa de impedir a aprovação da convenção. (BRASÍLIA-DF - AG)

Chico Buarque, em sua famosíssima Vai passar, cantava "num tempo / página infeliz da nossa história...", referindo-se à nefasta ditadura militar. Desgraçadamente, a tal página infeliz está longe de ser virada, como demonstra a notícia acima. Os assassinos covardes de um passado recente continuam tendo força suficiente para usar as instituições nacionais a seu favor, garantindo a impunidade de seus muitos, tétricos e imperdoáveis crimes. Uma vergonha que precisa ser denunciada, a fim de que se saiba, se não a verdade, ao menos o encobrimento dela.
Há poucos dias, o Judiciário determinou novamente ao governo federal que torne públicos os arquivos sobre esses crimes políticos. Já se sabe o que vai acontecer: por todo o país, mais e mais documentos serão destruídos, como ocorreu no primeiro mandato de Lula, assim que se cogitou a possibilidade dessa divulgação. E ninguém será punido.
Se assim for, a página infeliz de nossa história jamais será virada, porque o drama não terá um fechamento. E a ferida que não fecha dói para sempre.

2 comentários:

Anônimo disse...

Que bom! Mas esse projeto de lei versa sobre punição e cadeia para os ativistas do socialismo que barbarizaram, torturaram e também matarm? Se não, é falho e revanchista!

Yúdice Andrade disse...

Caro anônimo, não entendi bem o seu ponto, mas entendo que jamais faltou legislação para punir o que você chamou de "ativistas do socialismo". Para eles, o Código Penal e, o que é pior, a Lei de Segurança Nacional sempre estiveram em vigor. Assim, com o arcabouço legislativo existente já é possível punir o lado do qual você não gosta.
Quanto ao lado que você parece apoiar, esteve sempre impávido e livre, como se crime algum houvesse cometido. Seria bom tratar ambos os lados de modo igual, não?