segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Deixa ela entrar

Um dia, folheando a esmo uma dessas revistas semanais, topei, na seção de entretenimento, com elogios ao filme sueco Deixa ela entrar (Låt den Rätte Komma In, dir. Tomas Alfredson, 2008, baseado no livro de John Ajvide Lindqvist, que roteirizou o filme). Sim, o título em português é assim mesmo, inadmissível. Mas me chamou a atenção a crítica entusiasmada ao inusitado filme de vampiro, que recebeu seis indicações a melhor filme em festivais de cinema, vencendo duas, inclusive o do respeitado Festival de Tribeca.

O fantasmagórico Oskar
na verdade é humano.
 A história se passa num subúrbio de Estocolmo, em 1982. Oskar (Kåre Hedebrant) é um menino de 12 anos ("oito meses e nove dias") com problemas de adaptação até onde se sabe rotineiros nessa quadra da vida. Para seu azar, foi eleito o saco de pancadas de um típico babaca de escola, Conny, que anda sempre com dois outros babacas a seu serviço. Não revela a ninguém o bullying que sofre, mas ensaia com um canivete a vingança que provavelmente jamais consumará. Sua vida, contudo, começa a mudar com a chegada de Eli (Lena Leandersson), uma menina da mesma idade que se muda para o apartamento ao lado, parede com parede. Vive apenas com um homem que se presume ser seu pai, no apartamento cujas janelas são vedadas para não entrar luz solar. É quando começam a acontecer assassinatos, nos quais as vítimas são sangradas e o sangue, levado.

Eli numa cena relacionada
ao título do filme.
 Oskar e Eli se encontram sempre à noite, num parque em frente ao prédio onde moram. Após um primeiro contato onde os dois agem com infantil hostilidade, bem comum na idade, vão se aproximando a ponto de passarem a considerar o relacionamento como um namoro. Há claras insinuações de que o sexo está se entranhando na mente do garoto. Mas há questões muito graves com que lidar, relacionadas à sobrevivência de ambos. E um acabará ajudando o outro em suas respectivas necessidades.
É interessante como o filme foi apresentado como pertencendo ao gênero terror. Sou leigo, mas discordo. Para mim, é um drama, que desenvolve seus personagens a partir de premissas próprias do terror. Mas quem assistir esperando as características próprias dos filmes de terror (mesmo os filmes europeus, mais psicológicos e menos sanguinolentos), há de se decepcionar. Sim, você verá mortes, pescoços sendo sugados, incidentes grotescos, uma criatura escalando paredes e até mesmo elementos clássicos da mitologia vampírica (a ojeriza à luz solar e a necessidade de ser convidado para entrar na casa alheia, o que remete ao título do filme), mas se suprimíssemos qualquer elemento fantástico é muito possível que pudéssemos contar a história dos adolescentes, notadamente de Oskar, perdendo a sua inocência e se tornando algo que mete medo de verdade, porque se não com vampiros, podemos topar com gente assim na vida real.

Vampiros e luz solar não combinam.
 Deixa ela entrar é uma obra interessantíssima. Possui um ritmo europeu (muito mais lento do que o americano, porque menos comercial, chega a incomodar um pouco na primeira meia hora), mas defende um roteiro coerente, bem amarrado quanto ao desenvolvimento dos protagonistas, com personagens cativantes (a seu modo, claro), aliado a nuanças delicadas, bonitas até.
Filio-me à corrente segundo a qual os vampiros são os monstros mais fascinantes que existem. Não é à toa que a literatura e o cinema estão repletos deles. São temas que volta e meia ressurgem. Desgraçadamente nem sempre com o requinte de um Entrevista com o vampiro (dir. Neil Jordan, EUA, 1994), podendo descambar para a mais absoluta babaquarice, como a patética série ("saga" é demais!) Crepúsculo, onde os vampiros são reduzidos a personagens de uma inconvincente estorinha de amor e uma criatura morta é capaz de gerar um filho, deslumbrando apenas o mundo teen GLS. Por isso, Deixa ela entrar é um alento, recuperando a condição dos vampiros como metáforas da maldade que já existe dentro dos seres humanos, esperando apenas uma oportunidade para eclodir.
Assista.

3 comentários:

Ana Miranda disse...

Acredita que no dia que eu fui ao cinema ver "Paranormal 2", aqui indicado por você, já estava fora de cartaz? Chegeui ao cinema toda animadinha e a moça disse que tinha saído de cartaz no dia anterior. Burra eu, nem para verificar antes...
Vamos ver se consigo ver esse. Alguns filmes nem estreiam em Juiz de Fora, somente os comerciais mesmo. Esse, pelo o que você descreveu, se estiver em cartaz por aqui, é daqueles que ficam muito pouco tempo em exibição...
Se bem que, como o bullying é o assunto do momento, talvez fique um pouco mais...

Yúdice Andrade disse...

Ana, o filme em questão já passou nos cinemas faz tempo. Eu vi na TV a cabo. É isso ou DVD, a essa altura do campeonato.

Victor Azuellus disse...

Ah... esse filme é muito bom! Daqueles que dá vontade de assitir mais de uma vez. Não é nenhum "clássico vampiresco" como Drácula ou Entrevista com Vampiro, mas pelo fato de tudo estar voltado para uma conotação metafórica tem seu próprio sentido e beleza.
E quanto ao comentário sobre a Saga Malhação, digo, Crepúsculo... vale lembrar que ao contrário do que a série diz, vampiros não brilham à luz do Sol!