Esqueça o maravilhoso poema Os Estatutos do Homem, de Thiago de Mello. A questão aqui é judiciária e legislativa.
Um jovem ingressou em juízo com uma ação contra o pai, pedindo indenização por abandono afetivo (há notícias de outros processos com semelhante finalidade). Frustrada a pretensão em primeira instância, mas acolhida pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que determinou o pagamento de 44 mil reais a título de indenização, o caso chegou ao Superior Tribunal de Justiça, que rejeitou a pretensão do autor.
O Ministro César Asfor Rocha disse que questões ligadas ao Direito de Família devem ser tratadas com base em seus princípios próprios e não naqueles relacionados ao Direito das Obrigações. Segundo ele, "por mais sofrida que tenha sido a dor suportada pelo filho, por mais reprovável que possa ser o abandono praticado pelo pai (...), a repercussão que o pai possa vir a sofrer, na área do Direito Civil, no campo material, há de ser unicamente referente a alimentos; e, no campo extrapatrimonial, a destituição do pátrio poder (...). Não posso, até repudio essa tentativa, querer quantificar o preço do amor".
O relator do recurso, Ministro Fernando Gonçalves, sustentou que "é preciso levar em conta que, muitas vezes, aquele que fica com a guarda isolada da criança transfere a ela os sentimentos de ódio e vingança nutridos contra o ex-companheiro, sem olvidar ainda a questão de que a indenização pode não atender exatamente o sofrimento do menor, mas também a ambição financeira daquele que foi preterido no relacionamento amoroso." E prossegue: "O pai, após condenado a indenizar o filho por não lhe ter atendido às necessidades de afeto, encontrará ambiente para reconstruir o relacionamento ou, ao contrário, se verá definitivamente afastado daquele pela barreira erguida durante o processo litigioso?"
Ao final, o relator negou a indenização citando até um comovente conto. Vale a pena ler os votos dos ministros, a que você tem acesso no sítio do STJ, fazendo consulta ao processo REsp 757411.
O caso não é novo: foi julgado em 2006. Mas o assunto volta à tona, agora, graças ao Projeto de Lei n. 700/07, proposto pelo deputado federal Marcelo Crivella (PRB-RJ). O iluminado parlamentar, contrariando as sucessivas manifestações judiciais negando a tal indenização, resolveu punir o desamor paterno... com até seis meses de cadeia!
Não há muito o que dizer sobre essa ideia ridícula. Há tipos penais difíceis de caracterizar na prática e esse seria um antológico, pela dificuldade, senão impossibilidade, de aferir se o pai teve dolo de abandonar e de causar danos emocionais sobre o filho.
Enfim, não há muito o que dizer quando a ideia é cretina. A questão da indenização rende um bom debate, mas a criminal...
Nenhum comentário:
Postar um comentário