domingo, 18 de maio de 2008

Finesse ao tucupi

Sexta-feira, 17 de maio. Após uma cansativa semana de trabalho, que só terminou após as dez da noite, menos de dez horas antes de retomar o batente de novo, decidi ter um momento para espairecer, relaxar e me re-energizar, em companhia de minha esposa — grávida, como todos sabem. Decidimos jantar e, para ter maior certeza de sossego, escolhemos o restaurante La Vie en Rose — um pouco mais francês e um pouco mais caro. Lá não teríamos a algazarra insuportável dos restaurantes italianos.
Ledo engano.
Tivemos a infelicidade de escolher um péssimo dia. Sentamo-nos na nossa mesinha para dois, junto a uma coluna. Bem ao nosso lado, uma mesa grande, onde despontava um dos mais famosos empresários da cidade. Rico, ostentador — a julgar pelos carros na frente do prédio — e celebridade graças à própria empresa (deduzam de quem se trata), acompanhado de staff habitual, onde se inclui um muito conhecido ex-vereador.
Meus amigos, vocês não imaginam como gritavam os homens da mesa! As mulheres, todas com os cabelos muito bem escovados, até se comportavam dignamente, mas as homens... Gritavam, levantavam-se, simulavam as histórias que contavam, empurravam-se, puxavam a camisa do outro e falavam palavrão. Sim, até um sonoro "filho da puta", de preencher todo o ambiente, rolou por lá. Se eu contasse o fato fora de contexto, vocês suporiam que eu descrevo o recreio de uma escola primária. Mas muito pelo contrário.
Pensamos muito em ir embora, mas resolvemos ficar, porque os pratos escolhidos valiam a pena. E valeram! Estavam perfeitos. Mas não conseguíamos sequer conversar, embora sentados frente a frente, separados por uma mesa de uns 50, 60 centímetros.
Em uma mesa menor estava um casal, conhecido da gangue a que me refiro. A fulana acendeu um cigarro. Naquele espaço pequeno e refrigerado, onde se lida com alimentos. Depois acendeu outro. Merece os termos que seus amigos diziam na outra mesa. Quem fuma perto de um não fumante merece ser tratado nesses termos. Registramos nossa reclamação junto ao maître, apenas para marcar posição.
Quem éramos nós, senão dois professores universitários assalariados, ousando jantar num restaurante requintado? Se reclamássemos de tudo que estava errado, eu ainda correria o risco de ser agarrado por seguranças e surrado. Quiçá até minha esposa grávida.
Esses são os ricos de Belém do Pará: finos e elegantes. Mas tomados por uma brutal arrogância quando minimamente contrariados.
Definitivamente, não estávamos em nosso ambiente. Daí que avisamos ao maître: tão cedo não voltaremos.

8 comentários:

Anônimo disse...

Esses metidos a ricos, empresários e suas e seus comparsas, são uns FILHAS-DA-PUTA.
É o mínimo que se pode dizer.
Minha solidariedade, professor, bem como à sua esposa. Feliz parto!

Anônimo disse...

Já nos fala Roger (Ultraje a Rigor): a vida é uma beleza, o que estraga é essa gente... Bem a propósito o nome da música é justamente o palavrão escolhido pelo animado grupo.

Vladimir Koenig disse...

Yúdice,
estou em São Paulo e passei pelo oposto aqui. Até estranhei o que aconteceu, pois o mau hábito de Belém me deixou com a boca torta. Não estou acostumado com muitas gentilezas no comércio de nossa capital paraense.
Fui almoçar em um restaurante com minha esposa, minha filha de colo e mais 4 pessoas e, como de praxe por aqui (tem sempre muita gente nos restaurantes), coloquei-me na fila para receber uma mesa e demo-nos a esperar. Comecei a estranhar quando de 5 em 5 minutos o garçom vinha me pedir desculpas pela demora, mas que não era para eu me preocupar, pois duas mesas já estavam terminando de almoçar. Passados poucos minutos, ele volta e pede enormes desculpas por ter chamado um casal antes de nós (que havia chegado antes de nós!?!?!?), mas é que a mesa deles era para 2 e não havia, ainda, mesa para 6. Ainda estava intrigado. Logo depois, ele nos chama e novamente pede muitas desculpas pela demora (foram apenas 20 minutos!!!) e nos encaminha para a mesa. Foi quando eu me dei conta de que ele nos deu absoluta preferência apenas porque estávamos com um bebê de colo e isso sem que nem tivéssemos pedido e nos preocupado com isso. Na verdade, ela estava ótima no meu colo, dormindo como um anjo, e batíamos papo animado com outras pessoas da fila. Sabe quantas vezes fui tratado assim em Belém, com tamanha educação e respeito? Nenhuma. Infelizmente, ainda preciso vir para São Paulo para receber tratamento igual. Contudo, não me canso de tentar ensinar aos empresários de Belém como quero ser tratado. E olha que não exijo nada além de cortesia e respeito.
Abraços,
Vlad.

Yúdice Andrade disse...

Quanto aos histéricos e fumantes-em-ambiente-fechado, certamente, anônimo. Agradeço a solidariedade.

Frase perfeita, Jesiel. Dessas que dá tristeza não ter eu mesmo inventado.

Anônimo disse...

são os homens exercendo seus podres poderes.Dinheiro não esta diretamente vinculado a educação. Talvez numa birosca em São Braz ou na terra firme , você encontre modos melhores.

Yúdice Andrade disse...

Meu amigo Vlad, é dessa distância imensa, que parece intransponível, que falo. Em outras cidades, o tratamento é naturalmente atencioso porque as pessoas são naturalmente gentis. Não tem a ver com o tamanho da cidade nem com a condição de capital. Fui muito bem tratado em cidades minúsculas, como Pomerode. É um refinamento natural, que leva as pessoas a agirem polidamente.
As coisas por aqui já melhoraram, mas há falhas imperdoáveis. Mesmo nos meus restaurantes favoritos, ninguém se desculpa se há fila de espera. Eles nos olham com uma cara de conforme-se-e-espere.
Enfim, se formos listar tudo, dará uma tristeza maior ainda. Espero que com essa onde de turismo crescente na cidade, alguém se lembre de que não basta criar postos de trabalho: é preciso qualificar os trabalhadores. Sem dúvida, contudo, vai demorar.

Edyr Augusto Proença disse...

Amigo Yudice
Que tal espairecer, no próximo final de semana, assistindo ao "Prc5 a voz que fala e canta para a planície"?
Lhe aguardo. Abraços ao Hudson. Parabéns pela vinda do herdeiro.
Edyr

Yúdice Andrade disse...

Anônimo das 13h23, já estive em algumas biroscas muito simpáticas. Não tenho dúvida de que tens razão.

Edyr, meu querido, já comentei com várias pessoas que estou interessadíssimo em ver o espetáculo de vocês. Por causa das minhas aulas noturnas, só posso ir aos sábados ou domingos, quando o Hudson não pode acompanhar. Compatibilizando isso com a gravidez da esposa, darei um jeito de prestigiar o trabalho da tua companhia. E espero que nos falemos por lá.
A herdeira agradece o carinho. Sucesso para vocês. Aliás, merda!