O senador Aloísio Mercadante apresentou projeto de lei instituindo o interrogatório do réu e outros atos processuais através de videoconferência. O PLS 679/2007 foi aprovado e encaminhado à Câmara dos Deputados, agora como PL 4361/2008. Apreciado pelas comissões técnicas em caráter conclusivo, ou seja, sem a necessidade de votação em plenário, foi aprovado e remetido à sanção da presidência da República no último dia 9. Isto significa que, nos próximos dias, o Brasil finalmente poderá ter a inovação tecnológica instituída.
Recentemente, foi declarada a inconstitucionalidade de uma lei do Estado de São Paulo com a mesma finalidade. O motivo foi de ordem formal: apenas a União pode legislar sobre Direito Penal e processo.
Eis a nova redação do art. 185 do Código de Processo Penal, segundo o projeto sob comento:
"Art. 185. (...)
§ 1º O interrogatório do réu preso será realizado, em sala própria, no estabelecimento em que estiver recolhido, desde que estejam garantidas a segurança do juiz, do membro do Ministério Público e dos auxiliares, bem como a presença do defensor e a publicidade do ato.
§ 2º Excepcionalmente, o juiz, por decisão fundamentada, de ofício ou a requerimento das partes, poderá realizar o interrogatório do réu preso por sistema de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, desde que a medida seja necessária para atender a uma das seguintes finalidades:
I – prevenir risco à segurança pública, quando exista fundada suspeita de que o preso integre organização criminosa ou de que, por outra razão, possa fugir durante o deslocamento;
II – viabilizar a participação do réu no referido ato processual, quando haja relevante dificuldade para seu comparecimento em juízo, por enfermidade ou outra circunstância pessoal;
III – impedir a influência do réu no ânimo de testemunha ou da vítima, desde que não seja possível colher o depoimento destas por videoconferência, nos termos do art. 217 deste Código;
IV – responder a gravíssima questão de ordem pública.
§ 3º Da decisão que determinar a realização de interrogatório por videoconferência, as partes serão intimadas com 10 (dez) dias de antecedência.
§ 4º Antes do interrogatório por videoconferência, o preso poderá acompanhar, pelo mesmo sistema tecnológico, a realização de todos os atos da audiência única de instrução e julgamento de que tratam os arts. 400, 411 e 531, deste Código.
§ 5º Em qualquer modalidade de interrogatório, o juiz garantirá ao réu o direito de entrevista prévia e reservada com o seu defensor; se realizado por videoconferência, fica também garantido o acesso a canais telefônicos reservados para comunicação entre o defensor que esteja no presídio e advogado presente na sala de audiência do Fórum, e entre este e o preso.
§ 6º A sala reservada no estabelecimento prisional para a realização de atos processuais por sistema de videoconferência será fiscalizada pelos corregedores e pelo juiz de cada causa, como também pelo Ministério Público e pela Ordem dos Advogados do Brasil.
§ 7º Será requisitada a apresentação do réu preso em juízo, nas hipóteses em que o interrogatório não se realizar na forma prevista nos §§ 1º e 2º deste artigo.
§ 8º Aplica-se o disposto nos §§ 2º, 3º, 4º e 5º deste artigo, no que couber, à realização de outros atos processuais que dependam da participação de pessoa que esteja presa, como acareação, reconhecimento de pessoas e coisas, e inquirição de testemunha ou tomada de declarações do ofendido.
§ 9º Na hipótese do § 8º deste artigo, fica garantido o acompanhamento do ato processual pelo acusado e seu defensor." (NR)
A nossa briosa Ordem dos Advogados do Brasil é contra a videoconferência. Alegando que o interrogatório é a oportunidade que o réu possui de fazer a sua defesa pessoal, o que procede, sustenta que a videoconferência dificulta essa possibilidade porque retira o "olho no olho". Este argumento considero uma completa asneira. Naturalmente, as críticas da OAB não se resumem a isso, envolvendo também comprometimentos à atuação do advogado.
Mesmo não sendo um entusiasta da tecnologia, entendo que nos adaptarmos a ela é um caminho sem volta. Os benefícios da videoconferência são inegáveis. Só a economia — refiro-me a dinheiro, sim — com o transporte dos presos já seria um bom argumento. Mas a questão da segurança é o fator mais importante. Aqui no Pará não temos histórico significativo de resgate de presos durante transporte terrestre, mas em outros Estados o poder do narcotráfico e do crime organizado não podem ser desprezados. Se até caminhões são atirados contra a parede da delegacia, para arrombá-la, imagine o que mais não estão dispostos a fazer. E por qual razão Fernandinho Beira-Mar só passeia de helicóptero se não a desgraça que seria se tentassem removê-lo pelo chão? Riscos intensos não apenas para o preso, cuja incolumidade está a cargo do Estado, mas para os agentes penitenciários e policiais, além da população civil, que pode ser surpreendida em qualquer esquina com um tiroteio durante resgate.
Outrossim, já perdi a conta dos processos que foram retardados por anos a fio, devido a falhas ou impossibilidades no transporte de presos, obrigando a redesignação das audiências.
Enfim, temos que pensar em como o mundo é hoje: seus perigos e as ferramentas capazes de desviar deles. Se a videoconferência não é o melhor sistema, não se pode negar que o modelo atual tampouco o é. Principalmente quando o juiz finge que interroga, o defensor finge que defende e o promotor de justiça finge que está presente ao ato.
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