Em Santos (SP), ontem, uma mulher, já em trabalho de parto e sentindo muitas dores, procurou uma maternidade municipal1, mas não foi admitida por um motivo prosaico: estava sem os seus documentos. Posta numa sala de espera, acabou tendo o seu bebê lá mesmo, auxiliada pelo marido e familiares.
Compreendo que há procedimentos de segurança que devem ser adotados, mas não aceito que a ausência momentânea dos documentos justifique a omissão de socorro. Afinal, haveria tempo de providenciá-los enquanto a gestante fosse atendida ou mesmo depois. O fato que a tudo prepondera é este: a moça estava em trabalho de parto e precisava ser atendida imediatamente. Simples assim. Tudo o mais deveria ficar para depois.
Felizmente, não houve intercorrências, mas é o caso de perguntar: como terminaria esta história se a criança estivesse invertida ou com uma circular de cordão apertada? Ou se a dilatação fosse insuficiente? Se o pai, no afã, de segurar a filha, lhe fraturasse um osso? Se houvesse falta de oxigenação? Estaria a prefeitura, agora, discursando técnica e solenemente sobre a sindicância para apurar responsabilidades. E talvez um enterro correndo, em outro canto da cidade.
1 Constituição de 1988:
Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde (...), além de colocá-los a salvo de todas as formas de negligência, etc.
5 comentários:
A falta de compaixão é preocupante...
Os meus dois partos foram cesarianas, no dia e hora escolhidos por mim. Não tenho noção do que seja a dor de um parto, mas consigo imaginar as dores dessa mãe. A dor do parto em si, e da dor da rejeição por causa de um pedaço de papel contendo seu nome e nome de seus pais...
Ana Miranda
Trata-se de um momento em que a mulher está muito vulnerável, bombardeada por hormônios. Difícil controlar as emoções. E o bebê sente todo o estresse. Sem dúvida, uma grande e desnecessária agressão à mãe e ao bebê, inclusive no sentido físico. No psicológico, uma agressão a todos os familiares.
Um absurdo tremendo professor. Coisas de país em desenvolvimento. Concordo que casos assim acontecem constantemente, mas trabalho de parto é outra coisa. Provavelmente os funcionários não são dotados de uma certa consciência cívica necessária a todos. Saúde é garantia fundamental. No lugar deles, procuraria com toda certeza algum tipo de reparação, até com finalidade de pressionar o Estado para que situações assim deixem de ocorrer. Apesar de todos nós sabermos que seria inútil.
Abraços
Isso é um absurdo sem tamanho. Não tinha conhecimento do ocorrido. O responsável pela instituição já se manfestou? Que papelão...Que vergonha!
O que mais assusta, Leo, é justamente é isso que chamas de falta de consciência cívica e que chamo de falta de humanidade.
Com certeza, até por conta da exploração midiática, a família vai atrás de uma reparação judicial. E devem ir. Primeiro porque é correto, segundo para dar exemplo.
Hellen, a maternidade informou ter aberto sindicância para apurar os fatos. Desconheço ter havido manifestação além dessa.
Postar um comentário