sábado, 27 de agosto de 2011

Liberdade com requisitos

Na quarta-feira passada, publiquei a postagem "Liberdade para Cacciola", na qual mencionei que Salvatore Alberto Cacciola estava em vias de ser posto sob livramento condicional. O ex-proprietário do Banco Marka foi condenado a 13 anos de reclusão (pena depois reduzida, salvo engano, para 12 anos), por crimes de peculato e de gestão fraudulenta de instituição financeira, ou seja, delitos contra o sistema financeiro nacional, o que se insere no conceito geral de "crime de colarinho branco".
Naquela postagem, afirmei que a liberação de Cacciola "expressa apenas o cumprimento das leis vigentes no país". No entanto, alertado pelo comentarista Daniel Giachin, que também é advogado, percebi que existe um sério problema nessa história.
Nos precisos termos do art. 83 do Código Penal, três são os requisitos para que um condenado obtenha livramento condicional:

  • cumprimento de uma fração da pena, que varia conforme o apenado seja ou não reincidente e esteja condenado por um delito hediondo;
  • mérito, aferido pelo bom comportamento carcerário, desempenho no trabalho oferecido na prisão (se houve um, o que é menos comum) e "aptidão para prover à própria subsistência mediante trabalho honesto";
  • e a reparação do dano causado pela infração, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo.
Como bem destacam Giachin e a própria reportagem em que me baseei, as operações ilegais de Cacciola causaram um prejuízo em torno de 1,5 bilhão de reais, que nunca foram devolvidos aos legítimos donos. Claro. No final das contas, acabamos por retornar à velha máxima: Direito Penal é mesmo só para pobre. Pode até acontecer, a cada passagem do cometa, de um rico ser preso, mas aquele velho aforismo de que o crime não compensa é balela. Neste país, quem enriquece ilegalmente pode até ser punido, mas não fica pobre.
Confisco dos bens obtidos de forma ilícita, embora seja previsto expressamente no Código Penal, é algo que recai sobre narcotraficantes, mesmo medalhões como Juan Carlos Abadía, que em última análise são nada mais do que pobretões que ganharam dinheiro às custas do crime e da violência, tornando-se poderosos pela força, mas sendo sempre clandestinos. Não posam em colunas sociais nem frequentam os grandes eventos da sociedade. Não saem nas revistas de glamour. Este é o universo de Cacciola e quem está nesse meio nunca tem os bens confiscados. Como disse na postagem anterior, ele voltará para casa milionário e feliz.
Por desconhecer os dados do caso concreto, notadamente no que tange à decisão proferida pelo juízo da execução penal, não posso esclarecer porque o livramento condicional foi concedido sem que a última exigência fosse realizada. Só posso dizer que as desigualdades do sistema se confirmam todo dia.
E ainda há quem negue.

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