sexta-feira, 7 de setembro de 2007

Professora do caralho

Esta semana, citei em uma de minhas aulas o delito de ato obsceno, para dizer que precisamos interpretar os usos e costumes sociais para decidir o que deve ser considerado obsceno, e portanto crime, ou não. Uma aluna então me indagou sobre o caso da professora Raimunda Gomes Castro, de Capanema, no olho do furacão há alguns dias, desde que pediu a seus alunos um trabalho sobre palavrões.
A professora, porém, está correta e, se valer de alguma coisa, tem todo o meu apoio. Eis os motivos:

1) Ela não ensinou pornofonias aos alunos. Pelo contrário, as pragas dos alunos, de no máximo 11 anos, mostrando a educação que trouxeram de casa, é que se tratavam habitualmente pelos piores termos possíveis.

2) A professora tentava discipliná-los, mas não era atendida. Um dia, por fim, teve a ideia de fazê-los pensar sobre as coisas que diziam, percebendo que os vocábulos usados não correspondiam ao que desejavam exprimir.

3) Pediu uma listagem dos palavrões que os alunos já usavam e os ensinou a usar o dicionário para procurar o significado. Usar o dicionário, por mais fácil que seja, é algo que muita gente não sabe fazer. Por isso, deve haver na escola orientação a respeito.

Recordo-me da banda Ultraje a Rigor, famosa nos anos 1980, com uma de suas melhores canções, Pelado (aquela do "nu com a mão no bolso"), quando bradava:


Sem roupa, sem saúde, sem casa
Tudo é tão imoral
A barriga pelada é a vergonha nacional

A canção denunciava o falso moralismo dos brasileiros bundas. Vinte anos depois, a mesma hipocrisia está em foco. As três famílias que decidiram processar a professora, ofendidíssimas (em uma delas há um militar, por certo acostumado aos discursos maniqueístas), deveriam responder porque seus filhos são tão bem educados em sala de aula e esclarecer o que eles fizeram para coibir a má prática. E a que atribuem o insucesso. Aliás, devem sobretudo esclarecer se eles mesmos falam palavrões em casa. Se falam, é melhor enfiar o rabo entre as pernas e parar de encher a porra do saco.
Quanto à opinião do delegado de polícia, de que houve crime, nem comento. O discurso policial é essencialmente moralista e higienizador, segundo ensinam os criminólogos. Para mim, é um discurso de força, vazio e ultrapassado. Conheço práticas bem mais condenáveis, que ocorrem cotidianamente nas delegacias.

Para mim, houve um método radical de ensino e disciplina, necessário naquele contexto. Num primeiro momento, considerei que a professora tinha errado não no mérito, mas na forma, já que os alunos ficaram constrangidos ao serem inquiridos em casa sobre o que faziam. Mas agora vejo que nem nisso a professora errou. O constrangimento não adveio do trabalho, mas provavelmente do reconhecimento de que o que eles já faziam é errado. Foi autocrítica.

Espero que o bom senso prevaleça e a Profa. Raimunda não seja mais incomodada do que já foi. Ela tem o meu respeito.

Quem quiser discordar de mim, tudo bem. O debate é essencial à educação. Mas aos puritanos de plantão, meu conselho é: fodam-se.

Estou certo de que o saudoso Eduardo Lauande, também professor, que escreveu um método para chupar buceta (nestes termos) e publicou na internet, concordaria comigo.

Video: http://video.globo.com/Videos/Player/Noticias/0,,GIM724920-7823-PALAVROES+LEVAM+PROFESSORA+E+PAIS+DE+ALUNOS+A+JUSTICA,00.html

4 comentários:

morenocris disse...

Vinícius tem o soneto do caju ! E termina com esse "palavrão" aí...rsrs

Beijos.

Frederico Guerreiro disse...

Bravo!

Carlos Barretto  disse...

É isso aí, Yúdice.
Fodam-se mesmo os plantonistas!

Yúdice Andrade disse...

Cris, transformei o soneto em questão numa postagem.

Fred, bravo também.

Barretto, não entendi. Falei em "moralistas de plantão", mas tu falaste em "plantonistas", palavra que tem significado próprio no teu jargão. Deus me livre comprar briga com plantonistas! É nas mãos deles que cairei na hora em que precisar...