segunda-feira, 17 de setembro de 2007

Saneamento básico


À vista do cartaz, recheado de estrelas globais, a comédia Saneamento básico, o filme pode passar por mais uma bobagem do florescente cinema brasileiro. Tem Fernanda Torres (maravilhosa, fora do estigma de Vani), Wagner Moura e Camila Pitanga (ele, enternecedor; ela, com ótima veia cômica, em nada lembrando o casal mais famoso da atual novela das nove), Bruno Garcia (na dose certa), Lázaro Ramos (o atual ator-mor brasileiro), os consagrados e adoráveis Paulo José e Tonico Pereira. Fechando o elenco, Janaína Kremer — a única desconhecida do grande público, perfeita no papel na servidora pública empenhada em usar bem uma verba federal.
O filme é absolutamente despretensioso, mas tem elementos que o tornam um produto sofisticado. Primeiro, sai do eixo Rio-São Paulo. A história se passa no Vale dos Vinhedos, no Rio Grande do Sul, uma região exuberante que você sai da projeção querendo conhecer. O enredo retrata pessoas simples (que nem sequer sabem o que é "ficção"), mas nem de longe o foco está na miséria ou nas desgraças sociais, que ao lado da ditadura militar constituem o clichê número 1 do cinema nacional.
Segundo a sinopse do sítio oficial do filme, a história mostra uma pequena vila de descendentes de colonos italianos na serra gaúcha afetada pela poluição de um arroio. Mobilizados, tendo à frente Marina Mandera (Torres), descobrem que a prefeitura não dispunha de recursos para saneamento básico, mas havia uma verba federal para produção de um curtametragem de ficção. "Os moradores da Linha Cristal passam então a fazer um vídeo de ficção que, segundo interpretações, é um filme de monstro, ambientado nas obras de construção de uma fossa, com o único objetivo de usar a verba para as obras. O que eles não esperavam é que a produção do vídeo fosse se tornando cada vez mais complexa e interessante."
Sem exageros destinados a provocar hiperuremia de riso, o filme é leve e nos leva a rir dos olhares, das indecisões, das gags. Destaque para a cena em que dois operários — um deles Lúcio Mauro Filho — fazem figuração e soltam um texto macarronicamente decorado. Aliás, todos os "atores" são de uma dureza cênica impagável. Fabrício (Garcia), p. ex., fala "ista" em vez de "está". O único que parece estar à vontade é Joaquim (Moura), que na pele do monstro chega a fazer uma dancinha ridícula quando mata suas vítimas.
Como não sou crítico de cinema nem de nada, graças a Deus, apenas sugiro que você assista ao filme. E preste atenção em Paulo José, que dispensa apresentações, soltando um enérgico improviso na cena do cientista que concebe uma teoria apocalíptica sobre monstros, e em Camila Pitanga, a Silene Seagal (sim, de Steven Seagal), recitando um belo poema sobre cabelos, que pode ser encontrado no sítio do filme.
Eu prestigio o cinema nacional. E fico encantado quando encontro pela frente um produto tão adorável, que dá vontade de ver de novo, junto com as crianças.

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