segunda-feira, 8 de outubro de 2007

O gosto pelo escândalo — parte 2

A atração pelo grotesco é forte e disseminada. Basta ver a rapidez com que os curiosos se aglomeram em torno de acidentados ou mortos, nas ruas. Mas é preciso que haja sangue. Se é apenas um mal estar, a curiosidade rapidamente desvanece. Mas se há uma fratura exposta, ah! que deleite!
Evidentemente, a má imprensa se aproveita disso. Ontem, por exemplo, em matéria de enorme destaque, comentava-se sobre a quantidade de homicídios em Icoaraci. A foto estampava uma das vítimas, caída numa imensa poça de sangue, com uma mulher agarrada ao corpo, suja desse sangue, boca escancarada numa expressão de desespero. Os vermes necrófilos devem ter vibrado.
Pode-se noticiar os fatos sem o apelo ao horror. A foto ilustrativa podia mostrar a ação da polícia, a família enlutada ou a comunidade. Havia muitas opções. Mas escolheram a mais agressiva. Dou a minha cara a tapa se alguém foi até aquela mulher pedir autorização para publicar a foto. Qual o quê?! Ela também é pobre, negra e marginalizada. Não é criminosa, mas vítima. Contudo, ela também está à disposição dos abutres. Inclusive seu corpo. A sua dor não tem direito à privacidade, pois alguém tem um direito prioritário, supostamente o de informar — na verdade, o de locupletar-se.
Não há comiseração, não há o menor traço de respeito sequer pelo cadáver. Não era muito em vida, provavelmente; não há de ser morto que merecerá alguma consideração do seu semelhante desassemelhado.
E no dia seguinte, uma manchete sangrenta se abriu para a curiosidade pública. Começava mais um banquete.

3 comentários:

Anônimo disse...

Olaaa Primo!!!

O homem tem gosto pela desgraça alheia, porque assim ele se sente superior, pelo ao menos em realção ao desgraçado que está sofrendo (ou sofreu e morreu). Eu gosto de explicar a situação dos aglomerados ao redor de um acidente sob este prisma, o da necessidade do ser humano se sentir superior, além do alívio de não ser ele ou alguém próximo, que acaba sucumbindo a suposta "dor" pelo "próximo- distante".

Eu ainda não acredito em ações desinteressadas, para mim somos todos individualistas e fazemos aos outros o aquilo que nos faz (ou nos faz achar) melhores e, principalmente, maiores.

Abraçaao primo!!!

Anônimo disse...

Apoiado
Abs

Yúdice Andrade disse...

Jean, há setores da Psicologia que corroboram essa premissa do individualismo, mas isso não precisa ser uma característica necessariamente ruim. Às vezes, é o individualismo que nos permite cuidar de nós mesmos e avançar. Mas tudo na vida pede moderação. A partir do momento em que o individualismo afeta a capacidade do sujeito de se relacionar, de se preocupar com o semelhante, e até mesmo o impulsiona a ações deletérias, aí ele precisa é de tratamento.

Abraços, Edyr. Sempre bom te ter por estas bandas.