O debate sobre segurança pública e direitos humanos continua rendendo.
Da aguerrida Anna Claudia Lins:
Não me deixo provocar por algumas pessoas que nos tratam como "o pessoal dos direitos humanos" pois sou sabedora de que algumas de nossas manifestações provocam debates acalorados surgindo diversos comentários do tipo:
a) os direitos humanos só se preocupam com os direitos humanos dos “bandidos”,
b) o pessoal dos direitos humanos não se solidariza com a família do policial assassinado, etc.
Afinal os discursos que envolvem os direitos humanos são fartamente distorcidos e "retorcidos" por quem tem claramente o interesse de desqualificar nossas ações. Porém acredito que devamos esclarecer alguns pontos a estas pessoas que por medo ou ignorância reproduzem tais (pré) conceitos quase sempre superficiais fundados na observação apenas de parte dos fatos extraído de um acontecimento complexo e que deveria instigar a uma observação mais profunda do todo, na essência do fato e não apenas na “aparência” como parte da mídia quer nos levar a acreditar quando nos oferece espetáculos agonizantes do dia a dia violento e excludente de nossa sociedade.
Frise-se que por “pessoal dos direitos humanos” segundo este conceito difundido, leia-se um vasto grupo heterogêneo de pessoas e aqui também me incluo que:
1) Não concordam que a polícia possa arrombar sua porta sem motivo e sem mandado;
2) Não concordam com a prática recorrente que as forças de coerção possuem o direito de “atirar primeiro e perguntar depois”;
3) Não concordam que a polícia possa humilhar (e estapear, e prender etc) um adolescente na rua só porque ele é ou aparenta ser um garoto de periferia, na cor da pele ou no estilo das roupas;
4) Acreditam que as instituições devem agir com inteligência e eficácia para identificar, julgar rapidamente e tirar de circulação os delinquentes, dando-lhes o encaminhamento adequado para que não voltem às ruas como fonte de risco á sociedade;
5) Acreditam que algumas “autoridades” e instituições abusam de seu poder, punindo com violência alguns e sendo benevolente com outros...
6) São contra a corrupção nas instituições e de “autoridades” e as recorrentes meias, cuecas, panetones e congêneres;
7) Denunciam a falta de apoio jurídico e psicossocial para as vítimas e seus familiares, além de se preocuparem com as ameaças as vítimas e testemunhas, principalmente em casos envolvendo “autoridades”, “políticos influentes” além de empresários e grupos econômicos;
8) Lutam contra a omissão criminosa do Estado quando o mesmo não executa políticas públicas essenciais a vida e a efetivação do princípio da dignidade humana, inclusive aos militares;
9) Lutam por uma sociedade justa, fraterna e mais igualitaria possível em uma sociedade excludente com um profundo abismo entre os que possuem direitos e áqueles que não possuem direitos ou simplesmente são invisibilizados.
Àqueles que reproduzem comentários dos quais li aqui cabe esclarecer que nos preocupam sim a morte do policial, aliás, nos preocupam todo o fato e suas conseqüências sob todos os angulos, e também sob a ótica dos familiares de todas as vítimas e não apenas de um ou de outro lado. Afinal isto não é uma partida de futebol em que há os torcedores do Remo e do Paissandu, ou uma luta de vale tudo entre dois grupos, os dos defensores de direitos humanos dos delinqüentes e os dos defensores dos direitos da vítimas. A defesa dos direitos humanos não merece ser colocada como um embate maniqueísta entre o bem e o mal, afinal direitos humanos são para todos, inclusive para os “menos humanos” e para os “demasiadamente humanos”. Os direitos humanos são na verdade um parâmetro de um ideário de Justiça Social e um conjunto de princípios jurídicos, legais, éticos baseados no princípio da dignidade humana.
O “pessoal dos direitos humanos” é, na verdade, a sociedade civil que espera ter o direito de viver com dignidade. Mas é intrigante que, nela própria, tantos se voltem contra seus interesses, sobretudo quando a sede de justiça fica forte demais, pendendo para a sede de vingança. Infelizmente a impunidade e o medo são capazes de transformar pessoas minimamente esclarecidas em carrascos aplicadores da lei de Talião. Talvez seja essa uma das origens de um fenômeno curioso: o discurso pronto e unívoco contra “o pessoal dos direitos humanos”.
Que sejam apurados sim os possíveis excessos, de ambos os lados até para que os familiares das vítimas possam ver investigadas as razões dessas mortes, o que claramente não irá trazê-los de volta, mas que ao menos possam ter direito á verdade.
Na ocasião, parabenizo também a atitude corajosa do Coronel Costa Junior o que prova que a mudança na corporação militar é possível a partir da mudança de comportamento e atitudes de pessoas dispostas a multiplicar tais atitudes, afinal as instituições são feitas de pessoas e quanto mais humanas, melhor.
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