Dia de finados
Do jeito que estão,
Dedico as flores.
Em se tratando de um haicai, dedico esta postagem ao Oliver, do Flanar. Considerei este poema um dos mais belos que já vi. O motivo você fica sabendo lendo isto:
Este haicai (poema em três versos) foi escrito pelo poeta chinês Bashô, 2000 a.c. Esta tradução é de um poeta brasileiro.
O poema tem um significado difícil de descobrir, mas que depois de descoberto, não admite outra solução.
Para quem gosta de escrever, sugiro esta nova-velha-inédita-bashoana belíssima modalidade de poesia: O poema enigma.
A mera retratação de um pensamento, como veio à mente e sem conexões lógicas, não produz poesia. Uma definição melhor que a do professor da Mari para o Haicai é de um poema miniaturizado com refinadíssimas técnicas. É mais ou menos como um chip inventado há milênios.
Vamos à análise do poema. No dia de finados, as pessoas dedicam as flores, em homenagem aos mortos, arrancando-as do pé e depositando-as nos túmulos. Bashô, no haicai, protesta contra isso. Porque isso é dedicar a morte à morte. Então ele dedica as flores, do jeito que estão, vivas, nos campos, sem arrancá-las. Lindo, não?
Em termos filosóficos, é um tributo da vida à morte. Dentro da filosofia oriental, que mostra a morte como a extensão da vida, Bashô dedica vida a vida e não morte a morte. Mas isso já é uma história mais profunda, e nem precisamos entrar nesse mérito para reconhecer uma construção poética perfeita tão sutil que poucos compreendem.
Ao contrário do que dito acima, Matuo Bashô não viveu por volta do ano 2000 a. C., e sim no século XVII. Nasceu em Tóquio, em 1644, e faleceu em Osaka, em 1694. Atribui-se a ele ter codificado e estabelecido os cânones do tradicional haicai japonês. A interpretação do texto, acima, parece bastante acertada, considerando que Bashô professava a filosofa Zen. Conheça alguns de seus haicais.
3 comentários:
Excelente, Yúdice! Poucas vezes vi e li homenagem tão profunda aos mortos no Dia de Finados. Arrematar com Basho, então, foi o máximo.
Muito grato e honrado por você citar meu texto, e o que é melhor, com as devidas correções. Convido-o a visitar minha página, que embora em reforma, é uma espécie de encarte no blog do jornalista Walter Rodrigues, Paraense como você.
Oliver, encontrei por acaso navegando na internet, enquanto selecionava textos para publicar. Como há de tudo na rede, acredito que os blogs cumprem uma função de sistematização. É nas visitas que faço que me enriqueço com muitas informações que, de outro modo, sequer sei como encontraria. Afinal, como eu poderia saber que um dia existiu um Bashô no mundo?
Caro Wilson Barros, fico feliz por ter tratado o seu texto no blog de um modo que mereceu a sua aprovação. Fiquei curioso com uma coisa: como você chegou até mim?
Visitarei sua página. Não conheço Walter Rodrigues, mas deve ser gente boa, como um bom paraense. Abraço.
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