Assisti a todos os shows que Adriana Calcanhotto fez em Belém, inclusive quando seu sobrenome tinha apenas um "t". Acredito que foram cinco, no total.
Na alvorada da década de 1990, quando estava bem no comecinho da carreira e só lançara seu primeiro álbum (Enguiço, 1990), a apresentação aconteceu numa casa noturna que bombava na época, o Olê Olá, um mondrongo de madeira com telhado de palha no valoroso bairro da Marambaia, que um dia pegou fogo e depois se acabou. No local, hoje, existe a 1.356.879ª loja da Yamada na cidade.
Naquela oportunidade, cheguei a visitá-la no camarim (por sinal, um espaço horroroso, indigno de uma artista como ela), onde eu, meu irmão e minha tia fomos recebidos com bastante cortesia. Lembro-me bem daquela noite, quando ela fez um de seus números por assim dizer humorísticos, cantando um jingle dos tempos da ditadura militar que começava com "Esse é um país que vai pra frente". Ao cantar o primeiro verso, a reação da plateia foi de riso irônico (como a própria cantora queria, obviamente). Acho que ninguém acreditava nessa ideia. A propósito, já procurei pela Internet e nunca encontrei a letra integral dessa composição. Se algum puder me fornecer, agradeço.
Anos mais tarde, o segundo show (maravilhoso!) aconteceu no Theatro da Paz, quando Adriana testava repertório para lançar um projeto futuro, ao vivo, que veio a se tornar o CD Público (2000). Naquela noite, também fui ao camarim, em companhia de minha amiga Erika Bechara. Ganhei um autógrafo e consegui duas fotos. Passados alguns meses, com o CD já lançado, ela retornou com o mesmo show, só que agora em sua versão final, mais elaborada.
A quarta apresentação foi na Assembleia Paraense, que então concentrava praticamente todos os bons eventos do gênero na cidade. Àquela altura, o CD Cantada (2002) já fora lançado e vimos uma Adriana mais agitada no palco, inclusive dançando funk.
E ontem, no dia em que completava 43 anos, Adriana voltou a Belém, desta feita para o lugar onde hoje quase tudo acontece, de chá de velhinhas a Fórum Social Mundial: o Hangar. A turnê do mais recente CD, Maré, chegou com uma apresentação bem comportadinha, privilegiando canções lentas que induziam, no máximo, aquele movimento pendular quando fingimos dançar. Quase um movimento de maré, se me permitem a analogia, aquele balanço delicando que experimentamos quando estamos dentro d'água.
Adriana Calcanhotto faz show para fãs. Se esse não é o seu caso, é provável que não gostasse do que foi apresentado. Tudo muito lento, exceto numa sequência já próxima ao final, que mesmo assim não supriria a necessidade que muitos têm de adrenalina. Até o som estava econômico, digamos assim. Não sei se foi proposital (ela é tão proposta que bem pode ter sido), mas pela primeira vez estive em uma apresentação musical de onde não saí surdo. Pelo contrário: quando ela falava ou quando cantava uma canção que eu desconhecia, não dava para entender o que dizia.
Adriana, que você vê aí à esquerda fazendo o que mais gosta (cantando e tocando seu violão), metida num lindíssimo figurino, está com a voz mais linda do que nunca. Aveludada, mágica, uma delícia de se ouvir não apenas quando canta, mas também quando fala. A beleza peculiar de seu rosto aumenta quando ela abre um enorme sorriso de prazer, cantando. Seus dons poéticos continuam afinadíssimos, como eu já sabia desde há algumas semanas, ao comprar o CD. E ela continua performática, experimental, ensimesmada, como os grandes poetas românticos. Quando o público reconheceu os acordes iniciais de "Mais feliz" e se danou a cantar, ela não se perturbou: só começou a cantar quando bem entendeu. Na primeira vez em que cantaram parabéns, ela não se manifestou. Na segunda. disse duas vezes "obrigado" e só. Se você não é fã, vai achá-la antipática.
Como fã, adorei.
2 comentários:
Ela é demais, professor! eu praticamente cresci ouvindo adriana, meu pai que D-us o tenha e minha mãe saõ fanáticos por ela, não tinha como ser difertente comigo.
abraços.
Então temos em comum algo que nos preenche muito, minha querida. Abraços calorosos.
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