No mundo do Direito, é facílimo encontrar livros oportunistas, de conteúdo duvidoso, destinados apenas a atender a uma vasta gama de público, os concurseiros profissionais. Detesto livros para concursos. Detesto. Sequer os retiro das prateleiras. Parto da premissa de que quem estuda aprofundadamente a ciência deverá estar apto a fazer essas provinhas de concursos — imbecilizantes, ao menos na primeira fase.
Estou com um desses oportunistas em mãos. O autor já começa explicando que não pretende "apresentar novidades na área penal, mas analisar, didaticamente, cada aspecto, relativo não somente à Teoria do Crime, como, também, à Teoria da Pena, mostrando, sempre que necessário, o fundamento, a situação e a utilidade de cada instituto". Falando em bom português: não esperem de mim aprofundamento em nada! Nessa obra, aprofundado só mesmo o número de vírgulas.
Mas a leiturinha valeu a pena. Difícil pensar que alguém ria lendo um livro de Direito Penal. Mas o camarada conseguiu me fazer rir, graças a algumas decisões de tribunais que coligiu, em relação ao delito de maus tratos, objeto da minha aula daqui a meia hora. Veja só o que já decidiram os nossos tribunais por aí (destaques meus):
"Maus-tratos. Professora provocada por comportamento do aluno, pespegando-lhe um tapa. Atenuante de violenta emoção reconhecida. Afastamento da agravante. Considerações em torno da espinhosa missão de ser mestre nos dias atuais. Aplicação da pena no mínimo legal" (TARS - JTARS, 93/75).
Obrigado aos magistrados por reconhecerem os nossos padecimentos. Mas não precisava aliviar a professora tão descaradamente...
"Os limites do direito de corrigir são elásticos. Não se pode com qualquer pancada dar por caracterizado o excesso em seu uso. Hão de ser considerados também o nível social do acusado e a intensidade da peraltice da vítima" (TACrim - RT, 567/334).
Eis que surge um novo conceito jurídico-penal, como critério para a dosagem da pena: intensidade de peraltice!
"Age em estado de necessidade a mãe que, não tendo quem cuidasse do filho traquinas e adoidado, enquanto trabalhava fora do lar para sustentá-lo, acorrentava-o ao pé da cama, para que não saísse de casa" (TACrim - RT, 503/345).
Exemplo de linguagem jurídica formal e técnica. O que será uma criança adoidada? E ela não seria assim, em parte, por causa da mãe? Tudo tão complicado...
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